29 maio 2015

na universidade católica

Sessão de apresentação do livro "D. Manuel António Pires, história de vida de um missionário (1915-2015)", no passado dia 27 de Maio, pelas 19 horas, na Universidade Católica.



Alguns momentos dessa sessão que contou com a presença dos bispos do Porto e de Bragança-Miranda, assim como do Prof. Doutor Henrique Manuel Pereira, que fez o favor de apresentar a obra.

Intervenção:

Boa tarde,

1- Agradecimentos:

Aos presentes,

Aos membros da mesa - a D. António Francisco dos Santos, Bispo do Porto, pela sua presença, participação e pelas simpáticas palavras, a D. José Manuel Cordeiro, Bispo de Bragança-Miranda, pela sua presença aqui e durante todo o projecto, ao Professor Doutor Henrique Manuel Pereira, meu amigo Henrique, por nos abrir as portas desta casa, pelas palavras, pela colaboração, pelo saber e pela disponibilidade para este nosso projecto, para este livro. Grato me sinto.

Aos familiares de D. Manuel António Pires e a todos quantos participaram e informaram este trabalho.

2- Apresentação/explicação deste livro:

a. Ideia e âmbito,

b. Ponto de partida - textos manuscritos,

c. Partes que constituem o livro,

Estamos perante uma história imperfeita, porque cheia de hiatos e lapsos temporais, de uma vida longa e preenchida... O que nos levantou alguns problemas metodológicos: que fontes utilizar?, existem testemunhos contemporâneos?, como chegar às instituições da Igreja?, como suprimir as distâncias geográficas que balizaram a sua vida, a sua missão e a sua actuação?

Aquilo que fizemos, dadas as limitações e os constrangimentos existentes, foi utilizar toda a documentação e informação disponíveis para preencher os diferentes tempos de vida de D. Manuel.

3- Considerações:

Agora e depois do afastamento temporal e emocional necessários em relação ao processo de investigação e ao processos de escrita, consideramos oportuno trazer-vos algumas considerações, resultantes de alguma reflexão entretanto realizada...

a) Numa perspectiva diacrónica, podemos afirmar que a permanência e o trabalho missionário de D. Manuel António Pires em Angola e em Silva Porto se caracterizou por três ambientes distintos:

· Entre 1955, ainda Coadjutor, e 1961/62, já titular da diocese, num ambiente de paz social e política, fortemente controlado pelas forças e valores do Estado Novo;

· Entre 1961/62 e 1964, num ambiente de inquietude e sobressalto, provocados pelo terrorismo e pelos movimentos guerrilheiros que foram assediando a região;

· Entre 1974 e 1979, num ambiente de caos completo e permanente, face às destruições das guerras;

b) Ainda em diacronia, perceber como a Igreja, e em concreto a Igreja de Angola, e mais em particular, a Diocese de Silva Porto e D. Manuel, enquanto responsável máximo dessa diocese, vai adequando o seu trabalho, a sua missão, as suas preocupações, ao combate ideológico temporal da instituição da Igreja contra os seus "inimigos" ou "adversários". É perfeitamente perceptível no trabalho de D. Manuel (e provavelmente dos outros bispos contemporâneos também), através da sua correspondência, através das Cartas Pastorais, das Circulares e de artigos publicados, as suas preocupações com:

* O Protestantismo, numa primeira fase da sua estadia em Angola, em que chega a publicar a tradução de italiano para português, da obra "Comunidades dissidentes", na qual se identificam e caracterizam as comunidades não católicas existentes. Os protestantes como entidades rivais, presentes no mesmo território, mais antigos e nalguns casos com maior implementação na região, que roubavam almas ao catolicismo;

* Com a realização do Concílio Vaticano II, no qual D. Manuel participou nas suas quatro sessões, e com as conclusões do mesmo, assistimos a uma mudança de atitude e as preocupações pastorais centram-se agora no combate ao Comunismo. Verdadeira ameaça e que ocupa tempo e espaço não só a D. Manuel como à própria Igreja angolana. Isso pode ser testemunhado pelos documentos resultantes das Conferências Episcopais de Angola e S. Tomé, durante a segunda metade da década de sessenta e início da de setenta;

* Depois, com o 25 de Abril de 1974 em Portugal e a independência de Angola em 1975, assistimos a nova alteração de paradigma e nessa altura face aos ataques dos movimentos políticos angolanos, ateus, secularizantes da sociedade e do estado, a Igreja e, neste caso em concreto, D. Manuel desvaloriza o problema dos protestantes, procurando neles aliados face a esse novo inimigo comum;

* A própria Igreja em Angola procurou muito rapidamente adequar-se aos novos tempos e às novas realidades, produzindo Cartas e outros documentos onde as palavras democracia e liberdades aparecem com destaque e como grandes novidades face a discursos anteriores.

c) Numa perspectiva sincrónica, perceber como enquanto entidades estruturadoras e estruturantes do território, as dioceses eram administrativamente importantes. Eram as dioceses que estabeleciam alguma organização a grande parte do imenso território das colónias portuguesas. Eram as dioceses quem infra-estruturava muitas localidades remotas. Eram os Bispos dessas dioceses os principais responsáveis pela gestão, pela estratégia, pela política de investimentos e de localização de novas estruturas e equipamentos. Nessa qualidade, eram os Bispos dessas dioceses figuras proeminentes nas comunidades locais e nativas, e tinham um conhecimento efectivo do território e das suas realidades socio-económicas, como se calhar muitos nomeados políticos do regime não possuíam. Num período histórico de tamanha importância para as duas nações, como foi o período da revolução de Abril e da independência de Angola, os Bispos portugueses em Angola, eram figuras centrais, testemunhas privilegiadas de todo o processo.

Das leituras que fizemos e dos documentos que consultámos sobre esse período, ficámos com a sensação que nenhum desses intervenientes deu a devida importância histórica e a relevância das suas participações nesse momento do nosso passado recente. D. Manuel não deixou nada escrito sobre esses momentos, e se não fossem as duas entrevistas que deu em 1979, já em Portugal, em que se aventura num ataque cerrado e violento aos movimentos de inspiração marxista angolanos que protagonizavam a guerra pelo poder, nada saberíamos sobre a sua experiência. Mas outros Bispos portugueses que experimentaram esse período e que mais tarde passaram para o papel as suas memórias de Angola - e estou a referir-me por exemplo, a D. Manuel Nunes Gabriel, a D. Eduardo André Muaca, a D. Eurico Dias Nogueira e a D. Moysés Alves de Pinho - e nas quais recordam em pormenor muitos momentos vividos nas suas dioceses angolanas, estranhamente não ultrapassaram as notas de rodapé para se referirem ao processo de independência de Angola e às suas experiências traumáticas ou de seu conhecimento. Ficámos assim como que órfãos de um conhecimento, ou melhor, da possibilidade de um conhecimento que interessava a todos nós, ainda hoje. E com isto não estamos a criticar o referido episcopado, mas antes sim, a admitir, a assumir a plena frustração face a uma admissível expectativa pessoal.

Muito obrigado.

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