27 fevereiro 2008

Presente Atrasado

(proposta de alteração em sede de revisão gramatical)

Hoje, o tempo existêncial, aquele que vivemos, convencionou-se designar por presente e a noção que desde sempre existiu sobre o tempo, é o fatal e o pragmático agora. Este agora, presente, é quem permite que possámos ter a noção de temporalidade, daquilo que é, daquilo que foi e daquilo que será.
Hoje, nos dias de, essa existência temporal não obedece aos mesmos critérios de antanho. Vemo-nos enredados num precipitado cronómetro que nos obriga a estar e a não estar, a partir e a chegar, a ir e a vir, daqui para alí, dacolá para aqui, e nem damos conta do frenesim e da velocidade em que subsistimos.
Rodeados estamos de avisadores do tempo. Nunca como hoje houve tanto relógio per cápita... para além do tradicional relógio de pulso (que apesar de tudo, apesar da quase inutilidade, reduzido a mero adereço estético, ainda se usa...), temos acesso ao tempo a cada instante. Não há equipamento ou ferramenta que não exiba, em 1º plano, o seu contador de horas: telemóveis, televisores, aparelhagens sonoras, veículos, micro-ondas, fogões, fornos, frigoríficos, computadores, impressoras, banheiras, etc., etc. Todos eles contribuindo para conseguirmos viver a horas e cumprir "our schedule"... mesmo assim, não conseguimos, andamos em crónico atraso. A vida é um eterno atraso!...
Por isso proponho que se faça uma revisão gramatical (bem mais oportuna que o ignóbil acordo ortográfico) e se crie um novo tempo verbal: O Presente Atrasado, que passaria a ser a forma verbal a utilizar quando nos referimos à nossa condição quotidiana, de eminentemente atrasados.
Ilustração: Reunião marcada para as 17.30 no Porto. Chego às 17.15 ao local combinado. São 17.45 e continuo no local combinado à espera. Aproveito este tempo Presente Atrasado para colocar este ponto final.

26 fevereiro 2008

Last Note

Dearest, I feel certain I am going mad again. I feel we can't go through another of those terrible times. And I shan't recover this time. I begin to hear voices, and I can't concentrate. So I am doing what seems the best thing to do. You have given me the greatest possible happiness. You have been in every way all that anyone could be. I don't think two people could have been happier till this terrible disease came. I can't fight any longer. I know that I am spoiling your life, that without me you could work. And you will I know. You see I can't even write this properly. I can't read. What I want to say is I owe all the happiness of my life to you. You have been entirely patient with me and incredibly good. I want to say that - everybody knows it. If anybody could have saved me it would have been you. Everything has gone from me but the certainty of your goodness. I can't go on spoiling your life any longer.I don't think two people could have been happier than we have been.
V.
(Virginia Woolf's suicide note to her husband Leonard - March 1941)

22 fevereiro 2008

Inépcia Literária

Muita gente, se calhar eu também, acredita que há uma idade própria para cada "coisa". Admito que nunca dei muita importância a essa máxima popular, mas do alto da minha sapiência, dou comigo a ponderar determinados resultados, face a prováveis causas e a concluir que, presumivelmente, o factor idade e/ou maturidade também influência esses mesmos resultados.
Tudo isto virá a propósito da minha mais recente constatação: não consigo ler António Lobo Antunes (como me feriu o ser e me derrotou). Já por diversas vezes tentara: "Não Entres Tão Depressa Nessa Noite Escura", "Tratado das Paixões da Alma", mas não, nunca consegui. Nesta última experiência, tentei ler o livro "Boa Tarde às Coisas Aqui Em Baixo", mas o que é certo é que li cerca de 70 páginas e não percebi nada... absolutamente nada! Por isso, a decisão final... de não mais tentar ler este autor até uma outra idade maior, muito maior. Tenho pena... mas não é a primeira vez que tal me acontece, pois sucedeu o mesmo com Virgínia Woolf, que em tempos decidi experimentar e o resultado foi o mesmo. Na altura, e enquanto recolocava o livro "As Ondas" na prateleira, disse para mim próprio que um dia o recuperaria.
Derrotado, porque poderei estar perante os meus limites, naquilo que ficou mundialmente conhecido por COMPLEXO de PETER, que afirma que todos os individuos evoluem e são eficientes até determinado patamar, a partir do qual, não conseguem mais ser competentes, ou seja, todos nós atingimos o nosso nível de incompetência.
Entretanto, e por outro lado, até na leitura podemos aplicar essa máxima das idades, pois a minha experiência diz-me que existirão livros e autores, mas principalmente, linguagens e formas de escrever para cada idade. Quando jovem, lembro-me de ter descoberto a literatura de Miguel Esteves Cardoso e de ter devorado títulos como: "Viver todos os dias cansa", "O Amor é fodido", "A Causa das Coisas", entre outros. No entanto, hoje, e apesar de gostar das suas crónicas que aqui e acolá vamos encontrando na imprensa, não me cativa minimamente qualquer dos seus livros.
No fundo e na verdade, esta constatação pessoal e intransmissível é de menor importância, pois mesmo para a minha inépcia literária, haverá mais do que literatura suficiente para eu nunca conseguir ler tudo...

20 fevereiro 2008

Avulsas

(a propósito da ASAE)
...andam para aí obcecados com os critérios e normas de higiene e salubridade e, ao mesmo tempo, deixam-nos andar nos autocarros, amassados uns contra os outros, e quando um qualquer espirra (e uma tonelada de micróbios, bactérias e virus se libertam e invadem os poros dos demais), estes docilmente agradecem com um simpático "santinho(a)".... !?

(a propósito da pedofilia)
...como os tempos são diferentes!?... diz o meu pai e com razão: no meu tempo de Professor, quando nos calhava a 1ª classe, tínhamos que dedicar muito tempo a cada um dos miudos. Muitas vezes, àqueles que sentia mais carentes, de forma a cativá-los motivá-los, sentava-os ao colo e explicava-lhes individualmente, e com calma, a lição. Qual é o docente ou professor que, nos dias de agora, se atreve a tamanha intimidade!?...

18 fevereiro 2008

O Novo Eterno Retorno

Quase me apetecia não escrever o que fosse acerca desta imagem, mas vou escrever e só isto. Afinal, os (eco)sistemas ainda funcionam...

bem perto de Bragança

14 fevereiro 2008

Feliz Coincidência

No dia em que se festeja o dia do Valentim, esse estranho e anônimo que muitos consideram santo, a Europa assinala, também, o dia da disfunção eréctil. Feliz coincidência, sem dúvida... profiláctica e pedagógica metáfora que avisa a todas aquilo que são os perigos do uso do eréctil.

08 fevereiro 2008

O Som que Ouço

Digamos que motivado pela leitura e audição do mais recente post do Homem Moderno no seu blog, faço um exercício que muitos (e eu incluo-me nesse grupo) consideram injusto e pouco autêntico: o eleger o som que mais me agrada. Muitos foram já aqueles que conseguiram seleccionar a sua elite musical e fizeram questão de que o (resto do seu) mundo o soubesse. Embora já tenha pensado muitas vezes nisso, nunca como hoje, reflecti sobre quem são, de facto, aqueles(as) que comparticipam para a minha existência.
Eis a questão: Que som eu ouço?...
Pode ser que, comparado com alguns (muitos), eu seja um ignorante ou um desconhecedor do muito que se vai fazendo por esse mundo fora. Contudo, e mesmo tendo acesso a muita, variada e boa produção, que me chega através de meus irmãos, não consigo eleger mais do que um punhado de exemplares, que na minha escala de qualidade estão no top... e desconfio que por lá ficarão.
Antes de mais, a referência obrigatória, por respeito à minha história e ao meu crescimento, aos DOORS, esse mito da eterna juventude e que, ainda hoje, apesar de conjunturalmente ignorado pelas novas gerações, continua a ser sinónimo da excelência poética e musical.
São quatro, aqueles que, na verdade, estão lá, no meu cimo musical:
- Leonard Cohen, pelo veludo, pela luxúria dos ambientes criados e pela tez das suas palavras - que pena tenho eu saber que tudo isto findará...
- Beck, pela loucura e irreverência sonora;
- Nick Cave, pela complexa e arrogante maturidade - lá estaremos, na cidade também minha e no Abril;
- Tindersticks, pela harmonia, pela simbiose e pela simplicidade - sentidamente, a companhia perfeita para os fios de horas sós... noite ou dia, ténua ou ruidosamente;
Sei a extrema subjectividade e relatividade destes juízos de valor, mas o meu veredicto, idóneo e honesto, assim é.

Entrudo

06 fevereiro 2008

I'm Fucking Matt Damon

Esta maluca, a Sarah Silverman, foi ao programa de Jimmy Kimmel, na realidade seu namorado, e fez isto...

04 fevereiro 2008

Primeiro Telefonema

Numa tarde de Sábado de um Outono longínquo, em que nada se predispunha para ficar registado na história, um toque remoto, nada presente, que me atormenta a paz. Lentamente, o som torna-se mais próximo, mais intenso e irritante, até que de vez me desperta de um torpor febril. Estranho ninguém atender e a letargia própria destes estados alterados de consciência impede-me de o fazer de imediato. A insistência é tal que me obriga a agir.
Enquanto vou descendo as escadas, mantenho a esperança de que, seja quem for, entretanto desista e o telefone se cale… Mas não, ainda fui a tempo de atender. Sentado no antepenúltimo degrau das escadas, desnudado e completamente alheado da existência, atendo com um soturno Estou!?... Do outro lado, uma voz trémula e quase desconhecida pergunta-me se sou eu (!?)… Um forte tremor pelo corpo, talvez da febre, talvez do frio, concerteza por reconhecer aquela voz, faz-me finalmente avivar e apurar os sentidos.
Depois de um intervalo no tempo em que nada aconteceu e as distâncias impuseram as suas forças, num sotaque estranho, um sussurro doce, que me diz a falta, que me diz a saudade e a vontade de ver e estar. Num delírio, que não recordo bem, trocamos algumas simples e ambíguas palavras.
Despeço-me com a promessa (incerta) de um encontro breve, pouso o auscultador do telefone e regresso ao aconchego dos lençóis, num estado de espírito eufórico com a corajosa atitude e, com o mel da sua voz, adormeço na febre daquela tarde de Outono.