Ainda ontem fiz aqui, nesta esquina de espelhos, referência à nova revista Ler que acabara de chegar às bancas e, consequentemente, à minha mão e aos destaques que os meus olhos encontraram numa primeira olhadela... Pois bem, tendo tido uma manhã de tranquila leitura, li parte substancial da mesma. A entrevista a António Barreto desde logo me chamou a atenção e, agora, depois de lida re-confirmo a elevação da atitude e a qualidade do seu pensamento. Entre vários assuntos abordados, quero referir a sua perspectiva das novas tecnologias. Não que concorde totalmente com ele, mas porque surge num momento em que, academicamente, tenho partipado em algumas acesas e aguerridas discussões acerca da evolução dessas novas tecnologias e sua importância para os individuos e sociedades. Aconselho vivamente e com insistência para que leiam esta entrevista. No entretanto e para vos abrir o apetite, reproduzo aqui uma pequena parcela da mesma:
Considera a força da imagem uma ameaça ao livro?
Considero. Não sou capaz de lhe dizer: o livro vai desaparecer.
Até já disse o contrário. Numa conferência para editores, em 2001, dizia textualmente: «O livro é eterno.»
É verdade. Creio que é eterno mas creio que o consumo do que lá está dentro vai ser cada vez maior por outros meios. O livro como objecto, tal como o conhecemos hoje, vai ter tiragens menores, vai ter uma menor propagação. Dizem que há agora uns ecrãzinhos onde se põem lá dentro 50 livros.
Ainda não experimentou essas novas tecnologias de leitura?
Ainda não. Já vi fotografias. O que está em maior perigo imediato são os jornais e as revistas. Haverá sempre qualquer coisa que se pareça mas creio que nós vamos assistir, nos próximos 10 anos, à morte de um grande número de jornais no mundo inteiro.
A ameaça é a Internet?
É. O online substitui-os. Podemos sempre argumentar que o online pode dar coisas que os jornais não dão, nalguns casos pode ser melhor do que os jornais são. Muitos juízos podem ser feitos. Eu estou à espera da prova, não tenho uma visão definitiva sobre isso. Agora, o modo de leitura, a pausa, o sossego, a ponderação, a moderação, a reflexão, a nota, a posição pessoal, geográfica, física com que você lê jornais e lê livros, tudo isso está em vias de extinção, a benefício dessas novas formas que são mais rápidas, que seguramente proporcionam menos reflexão...
(...)
Sendo a Internet uma ameaça à leitura, como diz, o esforço para criar uma literacia computacional desde cedo será um erro?
A literacia computacional não é um erro. Eu tive que aprender, já tarde. De facto, o computador, a informática, a Internet podem transformar-se num instrumento de trabalho, de conhecimento e de comunicação importantes. Acho que todas as pessoas devem aprender a usar essas coisas.
Pergunto-lhe isto porque o Governo aposta, com o Magalhães, em criar essa literacia desde cedo.
De maneira como o Governo aposta na informática, sem qualquer espécie de visão crítica das coisas, se gastasse um quinto do que gasta, em tempo e em recursos, com a leitura, talvez houvesse em Portugal um bocadinho mais de progresso. O Magalhães, nesse sentido, é o maior assassino da leitura em Portugal. Chegou-se ao ponto de criticar aquilo a que chamaram "cultura livresca". O que é terrivel. É a condenação do livro. Quando o livro é a melhor maneira de transmitir cultura. Ainda é a melhor maneira. A coroa de todo este novo aparelho ideológico que está a governar a escola portuguesa - e noutras partes do mundo - é o Magalhães. Ele foi transformado numa espécie de bezerro de ouro da nova ciência e de uma nova cultura, que, em certo sentido, é a destruição da leitura.
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