Desafio:
Prezado cronista,
Os grandes acontecimentos também podem render belas crônicas, nesse caso, cronista, há que redobrar o cuidado para que no espaço que este periódico lhe reserva não apareça um artigo ou um pequeno ensaio, o que vai diferenciar um gênero do outro é que, para fazer uma crônica o acontecimento tem que focalizar mais de perto, até ser capaz de mostrar a pele humana, seu arrepio de emoção, sua contração de dor, seu tremer de riso ou felicidade, sua vida, enfim, explícita em cor, calor e cheiro.
Se puder filtrar os fatos por essa perspectiva, certamente valorizará seu espaço neste jornal com uma página que há de transpirar humanidade e verdade.
Posso aguardar sua tentativa?
O Editor
Os grandes acontecimentos também podem render belas crônicas, nesse caso, cronista, há que redobrar o cuidado para que no espaço que este periódico lhe reserva não apareça um artigo ou um pequeno ensaio, o que vai diferenciar um gênero do outro é que, para fazer uma crônica o acontecimento tem que focalizar mais de perto, até ser capaz de mostrar a pele humana, seu arrepio de emoção, sua contração de dor, seu tremer de riso ou felicidade, sua vida, enfim, explícita em cor, calor e cheiro.
Se puder filtrar os fatos por essa perspectiva, certamente valorizará seu espaço neste jornal com uma página que há de transpirar humanidade e verdade.
Posso aguardar sua tentativa?
O Editor
Sorteado:
Inquérito denuncia abuso sexual 'endêmico' de meninos na Irlanda
Mais de 2 mil crianças disseram ter sofrido abusos sexuais e violência física ao longo de 60 anos.
Da BBC
Mais de 2 mil crianças disseram ter sofrido abusos sexuais e violência física ao longo de 60 anos.
Da BBC
Um inquérito realizado na Irlanda revelou que mais de duas mil crianças sofreram agressões em abrigos infantis, reformatórios e orfanatos católicos do país ao longo de 60 anos e que, em instituições para meninos, o abuso sexual foi "endêmico" no período.
Segundo a Comissão de Inquérito sobre Abuso Infantil, os menores sofreram violência física e abuso sexual em locais que chegaram a abrigar cerca de 35 mil crianças até os anos 80, quando foram fechadas. O relatório, que aborda a situação de mais de cem instituições religiosas investigadas ao longo dos últimos nove anos, concluiu que os líderes da Igreja sabiam sobre os abusos sexuais de meninos. Além disso, segundo os depoimentos citados no documento, meninos e meninas das instituições apanhavam com tiras de couro por conversar durante as refeições ou por escreverem com a mão esquerda. "As escolas eram administradas de forma severa, impondo uma disciplina opressiva e não razoável às crianças e funcionários", diz o relatório. A comissão foi criada em 2000 pelo então primeiro-ministro irlandês Bertie Ahern, que pediu desculpas em nome do Estado às vítimas de abuso infantil. Um esquema de compensações do governo também foi estabelecido na época e, desde então, já pagou quase 1 bilhão de euros a 12,5 mil pessoas.
Abusos "chocantes"
Milhares de vítimas prestaram depoimento à comissão, que surgiu depois que uma série televisiva revelou a escala dos abusos. A jornalista Mary Raftery, que realizou os programas, disse que a extensão dos abusos era "profundamente chocante". Segundo a jornalista, as crianças eram levadas para "casas de terror" e ficavam confinadas até completarem 16 anos. "Elas saíam de lá completamente perturbadas e muitas deixaram o país em seguida", conta. "Elas sentiam que seu país as havia abandonado, assim como todo o resto, inclusive a religião." O relatório propõe 21 formas de o governo se redimir dos erros cometidos no passado, incluindo a construção de um memorial, um serviço de acompanhamento psicológico para as vítimas, muitas já aos 50 anos, e a melhoria dos serviços de proteção à criança na Irlanda. No mês que vem será divulgado um outro relatório sobre supostos abusos de padres católicos em paróquias perto de Dublin, capital da Irlanda.
Segundo a Comissão de Inquérito sobre Abuso Infantil, os menores sofreram violência física e abuso sexual em locais que chegaram a abrigar cerca de 35 mil crianças até os anos 80, quando foram fechadas. O relatório, que aborda a situação de mais de cem instituições religiosas investigadas ao longo dos últimos nove anos, concluiu que os líderes da Igreja sabiam sobre os abusos sexuais de meninos. Além disso, segundo os depoimentos citados no documento, meninos e meninas das instituições apanhavam com tiras de couro por conversar durante as refeições ou por escreverem com a mão esquerda. "As escolas eram administradas de forma severa, impondo uma disciplina opressiva e não razoável às crianças e funcionários", diz o relatório. A comissão foi criada em 2000 pelo então primeiro-ministro irlandês Bertie Ahern, que pediu desculpas em nome do Estado às vítimas de abuso infantil. Um esquema de compensações do governo também foi estabelecido na época e, desde então, já pagou quase 1 bilhão de euros a 12,5 mil pessoas.
Abusos "chocantes"
Milhares de vítimas prestaram depoimento à comissão, que surgiu depois que uma série televisiva revelou a escala dos abusos. A jornalista Mary Raftery, que realizou os programas, disse que a extensão dos abusos era "profundamente chocante". Segundo a jornalista, as crianças eram levadas para "casas de terror" e ficavam confinadas até completarem 16 anos. "Elas saíam de lá completamente perturbadas e muitas deixaram o país em seguida", conta. "Elas sentiam que seu país as havia abandonado, assim como todo o resto, inclusive a religião." O relatório propõe 21 formas de o governo se redimir dos erros cometidos no passado, incluindo a construção de um memorial, um serviço de acompanhamento psicológico para as vítimas, muitas já aos 50 anos, e a melhoria dos serviços de proteção à criança na Irlanda. No mês que vem será divulgado um outro relatório sobre supostos abusos de padres católicos em paróquias perto de Dublin, capital da Irlanda.
Crónica:
Ignomínia Social
Vivemos, de facto, num mundo hiper-mediatizado, no qual tudo é informação. Com a massificação das novas tecnologias, a toda a hora, a todo o segundo, somos bombardeados com soundbytes provenientes de toda a parte e arredores, tornando a comunicação algo caótica e humanamente impossível de absorver na sua totalidade. Quem produz toda essa informação sabe que aquilo que faz se destina a um consumo self-service, ou seja, a uma auto-gestão do consumo dessa oferta informativa. A velocidade e a quantidade destes processos de comunicação é tal que somos obrigados a criar filtros para aquilo que nos importa e queremos saber, através de critérios de relativização. Uma outra consequência desta massificação dos processos de comunicação foi a redução simbólica do planeta Terra, pois com tal volume de informações disponíveis, provenientes de todos os confins do mundo, é-nos permitido conhecer, ainda que virtualmente, esses mesmos recantos, que de outra forma nunca conheceríamos. É-nos possível ver em nossa casa, confortavelmente instalados, os horrores e as desgraças das vidas alheias, que numa sequência abismal desfilam diante dos nossos olhos. Este fenómeno permite-nos afirmar, com alguma razoabilidade, que habitamos um lar do tamanho do mundo inteiro.
Foi nesse conforto do lar que, nos últimos dias, fomos assaltados pelas chocantes notícias que nos chegaram da Irlanda, a propósito dos sistemáticos abusos sexuais que as crianças e jovens, institucionalizados em organizações religiosas, foram vítimas ao longo das últimas seis décadas. Mais do que o próprio abuso, o que impressiona e nos deixa completamente desarmados é a descrença e a insegurança que sentimos nas instituições, que à partida, mereciam todo o nosso respeito, a nossa solidariedade e a nossa confiança. Afinal, em quem podemos confiar os nossos filhos, as nossas crianças!?... Esta será a questão ou a dúvida que assaltou a consciência de toda a gente, que de uma forma ou de outra, sente também seu este drama. Impressiona como foi possível, durante anos e anos, décadas e décadas, gerações e gerações de crianças indefesas e abandonadas, terem sido abusadas psicológica e fisicamente sem nunca ninguém as ter defendido, sem nunca ninguém ter denunciado tal situação.
Bem sabemos que nada de novo aconteceu e, tendo em conta o conhecimento de outras situações similares que vão acontecendo e são notícia, um pouco por todo o mundo, aprendemos já a relativizar e desprezar tudo aquilo que não nos diz directamente respeito. Bem sabemos que não foi a primeira vez, nem será a última que tal sucederá, mas importa enfatizar estes factos, pois nunca será demais nem o suficiente para os evitar. Também porque considero que esta traumática existência não diz só respeito àqueles que a sentiram na sua pele, mas sim a todos nós que nos preocupamos e pretendemos construir um mundo melhor e assim o legar às gerações futuras.
Diz-se que o melhor do mundo são as crianças. Algo que eu, particularmente, acredito piamente. Chamem-me inocente ou ingénuo, não me importo!.. Não poderei é ficar impávido e sereno perante tal horror. Lutarei o que puder para o combater. Como progenitor sei que tenho como responsabilidade cuidar, proteger e educar os meus filhos; como cidadão sei que tenho como responsabilidade contribuir para o cuido, a protecção e a educação daqueles e daquelas que, infelizmente, não tiveram, não têm ou terão acesso a um lar e a uma família. Perante tamanha agressão aos nossos valores civilizacionais teremos que rever, urgentemente, a nossa posição perante determinados comportamentos e perante determinadas instituições. Não importa aqui quem são os criminosos – se professores, se monitores, se guardas, se padres, ou mesmo bispos. Não importa se o palco desses horrores são instituições religiosas, associativas ou seculares. Não poderemos tolerar mais que aqueles que deveriam ser a guarda e o seguro dos mais desprotegidos, sejam os seus mais terríveis predadores e, assim, destruam de vez a vida de tanta gente, que acabem com os cândidos sonhos de criança, transformando-os em horrendos pesadelos.
E ninguém cuidou de todas estas vidas esfrangalhadas?!.
Muitos deles e delas só agora, que chegam ao fim das suas (possíveis) vidas, quebraram o silêncio, só agora conseguiram admitir e partilhar essas terríveis experiências. Tantas e tantas vidas destruídas, tantas vidas adiadas para nunca mais, tantos e tantos traumas que terão resultado em errâncias, em violência e em desgraça. Quem se responsabilizará agora por todos esses danos causados!?...
Não podemos aceitar que o carácter totalizante de tais instituições sirva pervertidamente as taras e desvios de alguns. Revolta-me as entranhas o atroz silêncio imposto por essas organizações religiosas que durante tanto tempo promoveu estas pérfidas parafilias. Basta. É o Estado através dos nossos impostos que tem a responsabilidade última de garantir uma existência digna a todos os carenciados e, por isso, está na hora de exigir a verdade e a moralização do sistema; é o tempo de uma justiça que puna exemplarmente a depravação e a ignomínia social. Quero que o Estado, tal como promove, e bem, a existência das instituições de acolhimento para crianças, jovens, doentes e idosos, promova também a existência de instituições que acolham compulsivamente todos os indivíduos que sejam condenados por tais actos. Sinceramente, mesmo sabendo que nenhum passado seria recuperado, nem que nenhuma experiência seria modificada, sem excepção ou atenuantes e sem dó nem piedade, gostava de ver sofrer dos mesmos horrores todos aqueles e aquelas (que gostaria de adjectivar, mas que a falta de vocabulário próprio me impede), que um dia assim se comportaram. Para meu bel-prazer, lenta, sádica e violentamente.
Foi nesse conforto do lar que, nos últimos dias, fomos assaltados pelas chocantes notícias que nos chegaram da Irlanda, a propósito dos sistemáticos abusos sexuais que as crianças e jovens, institucionalizados em organizações religiosas, foram vítimas ao longo das últimas seis décadas. Mais do que o próprio abuso, o que impressiona e nos deixa completamente desarmados é a descrença e a insegurança que sentimos nas instituições, que à partida, mereciam todo o nosso respeito, a nossa solidariedade e a nossa confiança. Afinal, em quem podemos confiar os nossos filhos, as nossas crianças!?... Esta será a questão ou a dúvida que assaltou a consciência de toda a gente, que de uma forma ou de outra, sente também seu este drama. Impressiona como foi possível, durante anos e anos, décadas e décadas, gerações e gerações de crianças indefesas e abandonadas, terem sido abusadas psicológica e fisicamente sem nunca ninguém as ter defendido, sem nunca ninguém ter denunciado tal situação.
Bem sabemos que nada de novo aconteceu e, tendo em conta o conhecimento de outras situações similares que vão acontecendo e são notícia, um pouco por todo o mundo, aprendemos já a relativizar e desprezar tudo aquilo que não nos diz directamente respeito. Bem sabemos que não foi a primeira vez, nem será a última que tal sucederá, mas importa enfatizar estes factos, pois nunca será demais nem o suficiente para os evitar. Também porque considero que esta traumática existência não diz só respeito àqueles que a sentiram na sua pele, mas sim a todos nós que nos preocupamos e pretendemos construir um mundo melhor e assim o legar às gerações futuras.
Diz-se que o melhor do mundo são as crianças. Algo que eu, particularmente, acredito piamente. Chamem-me inocente ou ingénuo, não me importo!.. Não poderei é ficar impávido e sereno perante tal horror. Lutarei o que puder para o combater. Como progenitor sei que tenho como responsabilidade cuidar, proteger e educar os meus filhos; como cidadão sei que tenho como responsabilidade contribuir para o cuido, a protecção e a educação daqueles e daquelas que, infelizmente, não tiveram, não têm ou terão acesso a um lar e a uma família. Perante tamanha agressão aos nossos valores civilizacionais teremos que rever, urgentemente, a nossa posição perante determinados comportamentos e perante determinadas instituições. Não importa aqui quem são os criminosos – se professores, se monitores, se guardas, se padres, ou mesmo bispos. Não importa se o palco desses horrores são instituições religiosas, associativas ou seculares. Não poderemos tolerar mais que aqueles que deveriam ser a guarda e o seguro dos mais desprotegidos, sejam os seus mais terríveis predadores e, assim, destruam de vez a vida de tanta gente, que acabem com os cândidos sonhos de criança, transformando-os em horrendos pesadelos.
E ninguém cuidou de todas estas vidas esfrangalhadas?!.
Muitos deles e delas só agora, que chegam ao fim das suas (possíveis) vidas, quebraram o silêncio, só agora conseguiram admitir e partilhar essas terríveis experiências. Tantas e tantas vidas destruídas, tantas vidas adiadas para nunca mais, tantos e tantos traumas que terão resultado em errâncias, em violência e em desgraça. Quem se responsabilizará agora por todos esses danos causados!?...
Não podemos aceitar que o carácter totalizante de tais instituições sirva pervertidamente as taras e desvios de alguns. Revolta-me as entranhas o atroz silêncio imposto por essas organizações religiosas que durante tanto tempo promoveu estas pérfidas parafilias. Basta. É o Estado através dos nossos impostos que tem a responsabilidade última de garantir uma existência digna a todos os carenciados e, por isso, está na hora de exigir a verdade e a moralização do sistema; é o tempo de uma justiça que puna exemplarmente a depravação e a ignomínia social. Quero que o Estado, tal como promove, e bem, a existência das instituições de acolhimento para crianças, jovens, doentes e idosos, promova também a existência de instituições que acolham compulsivamente todos os indivíduos que sejam condenados por tais actos. Sinceramente, mesmo sabendo que nenhum passado seria recuperado, nem que nenhuma experiência seria modificada, sem excepção ou atenuantes e sem dó nem piedade, gostava de ver sofrer dos mesmos horrores todos aqueles e aquelas (que gostaria de adjectivar, mas que a falta de vocabulário próprio me impede), que um dia assim se comportaram. Para meu bel-prazer, lenta, sádica e violentamente.
Avaliação e comentários: (até 10 valores por júri)
Betty Vidigal - Não é crônica: é um discurso para político em campanha, criticando os outros e exaltando as próprias qualidades morais (“Não poderei é ficar impávido e sereno perante tal horror. Lutarei o que puder para o combater”, etc.). Nota: 6,0
Cida Sepúlveda - Linguagem excessivamente formal. Nota: 8,0
Lorenza Costa - (falta comentário...). Nota: 9,0
Luci Afonso - Bem escrito, próximo do ensaio, mas ainda com características de crônica. Nota: 8,0
Marco Antunes - Diante do padrão português tenho alguma dúvidas para julgar, uma vez que não domino a expressão popular de Portugal, pois, as cinco vezes em que estive lá foi sempre na condição de Turista. Por isso não sei se formas como “é-nos” são de domínio popular ou erudito (como seria aqui no Brasil) pois, se não for popular, é estranho ao ambiente da crônica! O autor é piedoso e, em determinados momentos, é tanta piedade e bom-mocismo que acaba por soar para quem lê a mais legítima prática de um vício chamado cabotinismo, que, como costumo dizer, ninguém consegue, a um só tempo, dele fazer uso e ser discreto quanto a isso! Nota: 7,5
Oswaldo P.Parente - Texto pesado, de difícil leitura. Nota: 7,5
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