23 agosto 2023

rituais que se vão repetindo

"Recordo tudo isto enquanto espero, sentado numa pipa de vinho perto do fim do mundo, e escrevo anotações num caderno de folhas quadriculadas que Bruce Chatwin me ofereceu para usar justamente nesta viagem. E não é um caderno qualquer. Trata-se de uma peça de museu, de um autêntico moleskine, tão apreciado por escritores como Céline ou Hemingway, e que já não existe. Bruce sugeriu-me que fizesse o mesmo que ele antes de usá-lo: numerar as folhas, escrever nas duas contracapas o meu nome e pelo menos duas moradas no mundo, e, na primeira folha, a promessa de uma recompensa a quem encontrar e devolver o caderno em caso de extravio.
[...]
Bruce informou-me de que os moleskines vinham das mãos de um encadernador de Tours, cuja família os fabricava desde princípios do século, mas que, após a morte do artesão, em 1986, nenhum dos descendentes quis continuar a tradição. Que ninguém se lamente por causa disso.
[...]
Quando Bruce Chatwin soube que nunca mais haveria moleskines, comprou todos os que encontrou e é num deles que escrevo estas notas."
Luis Sepúlveda, in revista LER verão 2023, página130.

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