A propósito do Plano de Ordenamento do Parque Natural de Montesinho, que se encontra, até ao próximo dia 17 de Outubro, em período de discussão pública, na qual participei enquanto membro da Assembleia Municipal de Bragança, mas acima de tudo, participante enquanto cidadão atento e preocupado com a realidade local e regional, permito-me agora, informado e conhecedor do documento em questão, tecer algumas considerações e criticar aquilo que considero ser um perfeito disparate que em nada beneficiará a região e, principalmente, as populações locais.
Sou um defensor da existência das áreas, das reservas e dos parques naturais, e neste caso concreto, quero que o Parque Natural de Montesinho (PNM) exista, que seja uma reserva da natureza e que a marca respectiva seja reconhecida e com sucesso. Valorizo a preocupação, a realização e a existência de um plano que estruture e enquadre administrativamente o território do Parque. Acredito também, na competência e na honestidade intelectual da equipa de técnicos responsáveis pela elaboração deste documento, pois sendo elementos pertencentes a uma organização, o ICNB, que promove a conservação da natureza e a biodiversidade, será legitimo que de uma forma evidente, declarada e inequívoca, privilegiem todos os elementos e caracteres naturais, endógenos e autóctones em detrimento da maximização da exploração dos recursos por parte do Homem e das Comunidades. Aliás, estranho seria que a atitude do ICNB fosse outra ou díspar.
Para além dos pormenores mais técnicos e específicos, interessa-me referir aquilo que considero ser o pecado original deste Plano de Ordenamento. O seu total distanciamento do HOMEM e das suas Comunidades.
Há um conjunto de práticas, um corpus habilitis e um modus faciendi, que têm permitido a permanência dessas comunidades neste habitat natural que é o território do PNM e que este Plano de Ordenamento poderá, a curto, a médio ou longo prazo, pôr em causa.
O Homem necessita de se identificar com o espaço que o rodeia. Pertencemos a um grupo com o qual partilhamos uma experiência temporal num determinado território, enquanto espaço produzido, entendido e organizado. Ocupamos caminhos, frequentamos lugares, como os cafés ou tabernas, cultivamos as terras, vamos à missa, etc., sempre tendo em conta a identidade partilhada com o grupo a que pertencemos. Viver é isto...
Estas práticas e representações estão intrinsecamente ligadas à paisagem e à vivência quotidiana, relacionando as necessidades mais vitais com o entrosamento dos habitantes de uma comunidade. Assim, poderemos compreender as fortes raízes que nos prendem ao território e como ele é importante e omnipresente, na estrutura lógica das representações e significados.
Por exemplo, os campos e as bouças que formam estrutura com a casa. Estes espaços possuídos e trabalhados por uma família e pela comunidade não são homogéneos e têm valores diferentes, pois a natureza dos terrenos predispõem-nos para diferentes cultivos e, por questões de prestígio, algumas parcelas podem ter cultivos mais cuidados. Assim, os diversos campos adquirem intimas relações com os trabalhos, as estações do ano e os produtos. Assistimos, então, à antropomorfização dos territórios, pois não há comunidade rural – freguesia, aldeia ou lugar, que não reconheça por um determinado nome cada recanto do seu território. Nomes como veiga, teixo, portela, fraga longa, lama, ribeira ou couto são frequentes nos termos e indicam um eterno sentido de pertença que tem, no entanto, um duplo sentido, uma vez que os indivíduos moldam o espaço, ao mesmo tempo que se deixam moldar por ele, pois o espaço é uma realidade duradoura e é através dela que podemos perpetuar no tempo a nossa memória individual, mas principalmente, a colectiva. Não conseguiríamos rever o passado se ele não se conservasse no meio que nos envolve.
É por isto que considero que este documento, mais do que um conjunto de artigos e alíneas, está pejado de significado e pode, deve ter uma leitura genérica e abrangente, no que concerne à perspectiva humana e sua presença neste território. É também por isto que desconfio que este documento é a demonstração de que o conhecimento deste território, por parte dos técnicos responsáveis, não será assim tão efectivo, deixando, igualmente, transbordar a ideia que os seus mentores e redactores estão bem longe do território em questão. Uma vez mais, vemos a região esquartejada e mapeada, de bem longe, através de controlos-remotos… e por isso, eles, não conseguem perceber que existe aqui, tal como em todos os territórios, uma forte simbiose entre o Homem e o espaço que habita.A equipa multidisciplinar do ICNB, afinal, não será assim tão “multi”, pois em nenhum momento manifestam qualquer preocupação social. Pena é que, na sua defesa intransigente da preservação dos valores e das espécies vegetais e animais, não seja também contemplada a espécie HOMO SAPIENS.
Sou um defensor da existência das áreas, das reservas e dos parques naturais, e neste caso concreto, quero que o Parque Natural de Montesinho (PNM) exista, que seja uma reserva da natureza e que a marca respectiva seja reconhecida e com sucesso. Valorizo a preocupação, a realização e a existência de um plano que estruture e enquadre administrativamente o território do Parque. Acredito também, na competência e na honestidade intelectual da equipa de técnicos responsáveis pela elaboração deste documento, pois sendo elementos pertencentes a uma organização, o ICNB, que promove a conservação da natureza e a biodiversidade, será legitimo que de uma forma evidente, declarada e inequívoca, privilegiem todos os elementos e caracteres naturais, endógenos e autóctones em detrimento da maximização da exploração dos recursos por parte do Homem e das Comunidades. Aliás, estranho seria que a atitude do ICNB fosse outra ou díspar.
Para além dos pormenores mais técnicos e específicos, interessa-me referir aquilo que considero ser o pecado original deste Plano de Ordenamento. O seu total distanciamento do HOMEM e das suas Comunidades.
Há um conjunto de práticas, um corpus habilitis e um modus faciendi, que têm permitido a permanência dessas comunidades neste habitat natural que é o território do PNM e que este Plano de Ordenamento poderá, a curto, a médio ou longo prazo, pôr em causa.
O Homem necessita de se identificar com o espaço que o rodeia. Pertencemos a um grupo com o qual partilhamos uma experiência temporal num determinado território, enquanto espaço produzido, entendido e organizado. Ocupamos caminhos, frequentamos lugares, como os cafés ou tabernas, cultivamos as terras, vamos à missa, etc., sempre tendo em conta a identidade partilhada com o grupo a que pertencemos. Viver é isto...
Estas práticas e representações estão intrinsecamente ligadas à paisagem e à vivência quotidiana, relacionando as necessidades mais vitais com o entrosamento dos habitantes de uma comunidade. Assim, poderemos compreender as fortes raízes que nos prendem ao território e como ele é importante e omnipresente, na estrutura lógica das representações e significados.
Por exemplo, os campos e as bouças que formam estrutura com a casa. Estes espaços possuídos e trabalhados por uma família e pela comunidade não são homogéneos e têm valores diferentes, pois a natureza dos terrenos predispõem-nos para diferentes cultivos e, por questões de prestígio, algumas parcelas podem ter cultivos mais cuidados. Assim, os diversos campos adquirem intimas relações com os trabalhos, as estações do ano e os produtos. Assistimos, então, à antropomorfização dos territórios, pois não há comunidade rural – freguesia, aldeia ou lugar, que não reconheça por um determinado nome cada recanto do seu território. Nomes como veiga, teixo, portela, fraga longa, lama, ribeira ou couto são frequentes nos termos e indicam um eterno sentido de pertença que tem, no entanto, um duplo sentido, uma vez que os indivíduos moldam o espaço, ao mesmo tempo que se deixam moldar por ele, pois o espaço é uma realidade duradoura e é através dela que podemos perpetuar no tempo a nossa memória individual, mas principalmente, a colectiva. Não conseguiríamos rever o passado se ele não se conservasse no meio que nos envolve.
É por isto que considero que este documento, mais do que um conjunto de artigos e alíneas, está pejado de significado e pode, deve ter uma leitura genérica e abrangente, no que concerne à perspectiva humana e sua presença neste território. É também por isto que desconfio que este documento é a demonstração de que o conhecimento deste território, por parte dos técnicos responsáveis, não será assim tão efectivo, deixando, igualmente, transbordar a ideia que os seus mentores e redactores estão bem longe do território em questão. Uma vez mais, vemos a região esquartejada e mapeada, de bem longe, através de controlos-remotos… e por isso, eles, não conseguem perceber que existe aqui, tal como em todos os territórios, uma forte simbiose entre o Homem e o espaço que habita.A equipa multidisciplinar do ICNB, afinal, não será assim tão “multi”, pois em nenhum momento manifestam qualquer preocupação social. Pena é que, na sua defesa intransigente da preservação dos valores e das espécies vegetais e animais, não seja também contemplada a espécie HOMO SAPIENS.
(publicado no Jornal Nordeste do dia 09/10/2007)
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