Mais e mais centralismo. A sangria não estanca e isto só terminará quando já não houver vivalma nestas paisagens rurais e interiores do país. Triste, muito triste.
---------"Viajar, ou mesmo viver, sem tirar notas é uma irresponsabilidade..." Franz Kafka (1911)--------- Ouvir, ler e escrever. Falar, contar e descrever. O prazer de viver. Assim partilho minha visão do mundo. [blogue escrito, propositadamente, sem abrigo e contra, declaradamente, o novo Acordo Ortográfico]
20 janeiro 2025
eu vou lá estar
Vou participar com uma comunicação em co-autoria com os meus irmãos, Daniel e Ricardo. Pela primeira vez e porque estamos atentos e preocupados com determinada realidade, decidimos participar num evento académico para partilhar e denunciar aquilo que está, neste momento, a acontecer e que não é mais do que o anúncio de um desastre ecológico e ambiental em potência. A nossa comunicação tem por título: "Extrativismo e resistências, imaginários e memória: estudo de caso de um desastre anunciado". Deixo o link para a página da Conferência: https://antropologiadoambiente.com/
humanidades canceladas
Neste último Sábado, Carlos Ceia, Professor Catedrático da FCSH da Universidade Nova de Lisboa, escreveu no jornal Público um texto importante sobre aquilo que ele considera ser a crescente perseguição e cancelamento institucional e político ao ensino das humanidades em Portugal. O paradigma vigente impõe e privilegia as áreas científicas ligadas ou relacionadas com o crescimento económico e isso traduz-se num reforço orçamental dessas áreas em detrimento das áreas das humanidades, deixando perceber que estas contam muito pouco nas urnas e que os "saberes" humanistas, naquilo que a "ciência pode trazer à formação cultural de cada cidadão" é cada vez mais negligenciado. Na verdade, esta situação não é propriamente uma novidade, pois ao longo das últimas décadas, ao olharmos para os currículos do ensinos secundários e superiores, temos vindo a verificar um desaparecimento dos conteúdos e das disciplinas das humanidades e das ciências sociais.
Na impossibilidade de transcrever para aqui todo o artigo, deixo dois parágrafos que, de alguma forma, traduzem a opinião do seu autor...
"A marginalização das humanidades comprometerá sempre as oportunidades trabalho interdisciplinar, que é essencial para enfrentar desafios sociais complexos. Não é possível compreender esses desafios sem as humanidades. Não será nunca possível compreender a raiz da maior parte dos problemas que tanto preocupam os políticos sem uma forte formação humanista. E nem sequer é possível compreender a importância de todas as ciências sem o pensamento humanista que as fundou.
Se querem mais pensamento crítico nas ciências, devem apostar numa maior consciência cultural e numa melhor capacidade para compreender aquilo que conseguimos fazer enquanto pensadores. Esta é a base de todas as ciências e as humanidades permitem que essa base comece a ser construída. Se as cancelarmos, se as asfixiarmos nas suas oportunidades de financiamento para que também possam produzir conhecimento novo, são todas as ciências que perdem e jamais poderemos ser o país desenvolvido que ambicionamos ser."
17 janeiro 2025
desagregação
Até que enfim!
A conhecida por "Lei Relvas" de 2013, vai ser hoje derrubada, exterminada, caducada, com a votação na Assembleia da República da desagregação de 135 uniões de freguesia, que resultarão em 302 novas (velhas) freguesias. Já nesse tempo, 2013, a percepção foi de que a maioria das populações não queria essa união e ela foi imposta por um poder, no mínimo, sem legitimidade para o fazer. Agora, e passados cerca de doze anos, finalmente, vai ser reposta uma realidade territorial que jamais deveria ter sido alterada. Dos 188 processos de pedido de desagregação, foram aceites 135 e serão estes os votados hoje - também aqui, pela expressividade do número de processos pedidos, se percebe a vontade popular e a impopularidade da referida lei de 2013. Claro que depois de hoje, a reversão da "Lei Relvas" continuará e nada impedirá essa pretensão das freguesias. Ainda que esta desagregação traga alguns problemas financeiros e, principalmente, logísticos, hoje será sempre um dia bom para a organização e estruturação do nosso território.
há muito desaparecido das livrarias
Leio no jornal Público de hoje, num texto assinado por Gonçalo Frota, que vai a (sub)-palco no Teatro São Luiz, o monólogo "Libertino", interpretado por André Louro e dirigido por António Olaio. Leitura do texto "O Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o seu Esplendor", escrito em 1961 por Luiz Pacheco. Nesta peça jornalística, para além da notícia deste monólogo, importa-me a constatação da relevância da escrita de Luiz Pacheco, "uma figura à margem", do seu "radical apego à verdade" e que, incompreensivelmente, está há muito desaparecido das livrarias, a não ser a preços especulativos em alfarrabistas, apesar da sua obra "perdurar e daqui a 200 anos será ainda actual".
Não posso ir ao São Luiz assistir, por isso espero e desejo que este monólogo possa viajar pelo país, pelo menos venha à Invicta, pois sou um admirador confesso do grande, do enorme Luiz Pacheco.
o melhor de? não me parece
Sou um leitor e admirador de Philip Roth e foi com surpresa que, em Dezembro, dei de caras com este livro à venda. Trouxe-o comigo e ontem foi o dia em que, num fôlego só, o li. O psicanalista paranóico da condição norte-americana e, principalmente, do devir judaico, mantém o seu registo e essência no universo e ambientes das suas ficções. Em todo o caso, agora que já o li, não percebo porque foi apresentado como "Escabroso, ousado e mordaz" (The Times) e "obscenamente chocante" (Harold Bloom, in The New York Times Book Review), quando na realidade nada de extraordinário é contado ou descrito e de orgias, pouco ou nada. Enfim, marketing editorial.
16 janeiro 2025
percepções
"Quando não há factos, o radicalismo populista encontra sempre forma alternativa de os substituir. Foi assim que entrámos no domínio da percepção, uma forma ardilosa de se alterar os mecanismos da discussão civilizada e construtiva, baseados na inteligência e da lucidez aplicada aos factos, para os enterrar nas meras indignações do dia tão típicas das redes sociais. Se não há um aumento de crimes provocados pelos imigrantes, pouco interessa, porque há sim, dizem os arautos da extrema-direita, a sensação de que eles existem."
Manuel Carvalho, in Jornal Público, 16 Janeiro 2025.
15 janeiro 2025
o que se quer é digitalizados
Mais do mesmo.
Até a Caixa Geral de Depósitos abandona o território nacional, nomeadamente as zonas interiores e as ilhas. Contudo, podemos ficar tranquilos porque o seu presidente, Paulo Macedo, garantiu que as seis dezenas de agências que deixarão de possibilitar depositar ou levantar dinheiro aos balcões, terão um funcionário que apoiará os clientes a lidar com as máquinas. Diz que não está a desistir dos territórios, mas sim, na sua missão pedagógica, "dar às pessoas a inclusão digital... o que se quer é que as pessoas se digitalizem", afirmou Paulo Macedo sem se rir.
O que é isso das "pessoas se digitalizarem? - Pergunto eu que, pelos vistos, sou digitalizado.
quiosques
Sempre gostei de quiosques, sejam de rua ou em formato loja. Sei que neles há sempre alguma (muita) coisa com interesse e onde é um prazer gastar dinheiro. Aliás, seria um dos poucos negócios em que me imagino, quero dizer, logo depois de uma livraria (de fundos bibliográficos), seria num quiosque que eu arriscaria investir e onde eu, penso, não me importaria de estar e ficar.
Acontece que, para lamento meu, nos últimos tempos, temos vindo a assistir ao seu desaparecimento das paisagens urbanas e, principalmente, seus arrabaldes. Serão várias as razões para tal fenómeno, desde logo, a mais do que reconhecida quebra de vendas de jornais em formato papel, mas eu continuo a precisar deles na minha existência quotidiana e tem sido crescente a dificuldade de encontrar aquilo que procuro. Mais uma "arte" urbana em vias de extinção.
12 janeiro 2025
likes, views, follows, friends
Apesar de estar presente e existir nestes ambientes digitais e desmaterializados há cerca de duas décadas, é sempre um problema para mim quando me tentam alertar ou explicar para a importância do número de visualizações, de seguidores, de amigos, de gostos e o diabo a quatro, daquilo que publico online, pois serão sempre esses os critérios de qualidade e de sucesso do que aqui partilho.
Criei este blogue há quase vinte anos e nunca foi preocupação saber se alguém vem cá espreitar, ler-me ou até conhecer-me. Claro que gosto de ser lido, visto e ouvido, mas não é essa a razão que me faz publicar e criar conteúdos, nunca foi. Agora que inicio um novo projecto de comunicação, com o podcast "Novas Conversas Rurais", volto a ser assediado e confrontado pelo marketing digital com a inevitabilidade desses medidores de sucesso. Tudo bem, mas no fundo, no fundo, não me importam, irei continuar a produzir conteúdos porque quero, me dá prazer e porque me obriga a procurar e descobrir novas realidades e conhecimentos.
10 janeiro 2025
desconstruindo, desmantelando, desequilibrando, assim vamos
Nestes últimos dias instalou-se um debate público em Portugal a propósito de uma iniciativa legislativa deste governo. Trata-se de uma alteração ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT) que, a se efectivar, alterará por completo o território nacional. O Decreto-lei, já promulgado pelo Presidente da República, mas que será ainda levado ao Parlamento e entrará em vigor no final deste mês de Janeiro, permitirá que as câmaras municipais ou as assembleias municipais, que é como quem diz, os presidentes e executivos camarários reclassifiquem solos rústicos em solos urbanos e assim, possibilitarem a urbanização, a construção e a especulação imobiliária em territórios que até agora estavam protegidos dessas agressões.
Segundo o ministro Manuel Castro Almeida, a intenção do Governo é promover "uma mudança estrutural" ao "aumentar a oferta de terrenos para construir habitação como forma de baixar o preço das casas". Acontece que o problema da habitação é sentido, na sua esmagadora maioria, nos grandes centros urbanos e aí os solos rústicos são praticamente inexistentes. Portanto, não é verdade que a preocupação deste Governo, e com esta iniciativa, seja a habitação e sua oferta a custos controlados. E nos solos urbanos há tanta disponibilidade para construir e reconstruir, que não se percebe esta iniciativa legislativa, os seus propósitos ou sequer o seu interesse ou necessidade.
Até hoje, ou melhor, até este Decreto-lei, mesmo com um instrumento anteriormente criado de seu nome "simplex urbanístico" que permitia algumas excepções, não era possível edificar ou urbanizar em solos rústicos ou solos classificados como Reserva Ecológica (REN) ou Reserva Agrícola (RAN), mas ao alterar desta forma o Regime Jurídico e ao capacitar os municípios desse poder de reconversão dos solos, aquilo que o governo está a fazer, na verdade, é mais um ataque ao património natural protegido em benefício de uns quantos especuladores imobiliários, que não olharão a meios para atingir os seus inquestionáveis fins. Ao mesmo tempo, esta alteração não fará mais do que potenciar e até legitimar os esquemas do clientelismo e as promiscuidades entre o poder autárquico e o sector imobiliário. Escancara-se a porta de acesso para a avidez insaciável dos capitais aos solos e territórios que deveriam permanecer salvaguardados e imunes a essa voragem.
A percepção que fica e se instala é que para este governo não haverá limites para a desconstrução ou desmantelamento do Estado e do que é público. Mais um crime lesa-pátria que esta a ser "legalmente" cometido, mas pelo qual ninguém, jamais em tempo algum, será responsabilizado.
Senhores, não é por acaso que existe a classificação de "solo rústico" e este assim deve permanecer, pois é aí que os equilíbrios do território, do ambiente e da biodiversidade acontecem. Imperativo.
01 janeiro 2025
#01 NCR - "O Novo Rural"
O primeiro episódio do meu podcast. Todos os meses uma nova conversa sobre o que de novo tem acontecido nas paisagens rurais.
É com enorme prazer que vos apresento a minha mais recente aventura. Criei um podcast ao qual dei o nome de "Novas Conversas Rurais" e, com ele, pretendo viajar pelo universo rural português, em especial, o transmontano, conversar e reflectir sobre tudo aquilo que de novo tem acontecido nessas paisagens.
Este é o primeiro episódio mensal, ao qual se seguirão outros com outros convidados e temas diversificados. Sendo o primeiro episódio, num projecto pessoal e quase solitário, as falhas, problemas e falta de experiência, são por demais evidentes, pelo que solicito a vossa tolerância. O compromisso será melhorar nas próximas conversas.
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