Da reflexão que tenho feito acerca do resultado das eleições legislativas de 5 de Junho, sobressai a ideia de que quem ganhou foi o discurso do medo. Para além de todas as leituras partidárias que já foram produzidas e de todas as leituras políticas que estão ainda a ser manifestadas, irei aqui reflectir em "voz alta" acerca da representações sociais e simbólicas desse discurso medroso (sim, também merdoso...).
Pressupostos:
a) Parte considerável da população portuguesa vive directa ou inderectamente dependente do Estado e suas participações, sejam funcionários públicos, pensionistas e reformados, estudantes, forças armadas, etc.;
b) Os dados tornados públicos relativos ao endividamento dos portugueses e das famílias portuguesas, demonstram uma forte apetência para comprarem dinheiro e se endividarem por períodos consideráveis;
c) O crédito mal parado tem vindo a crescer nos últimos anos, demonstrando a falta de capacidade (vontade) dos portugueses para cumprirem os seus compromissos;
d) Mesmo num péssimo contexto económico, muitos portugueses teimam em endividar-se para adquirirem tudo e o mais insignificante;
Tendo como aceitáveis e verosímeis estes pressupostos relativos à caracterização da sociedade portuguesa, e recordando os diferentes discursos produzidos pelos diferentes partidos, parece-me mais do que lógico e evidente que os portugueses, enquanto eleitores, aderiram rapidamente ao discurso daqueles que garantiram que, pelo menos a curto prazo, não iria faltar o dinheiro para as suas pensões e ordenados. Saber quem vai pagar os juros e que juros se vão pagar, não interessa aos portugueses, pois estão já habituados a pagar juros até para comer e vestir e, também, estão já habituados a pedir dinheiro e a não pagá-lo. Considero que é uma atitude mais do que legítima e que os partidos vencedores souberam aproveitar essa pressão, real ou não, mas que acabou por espelhar as necessidades imediatas dos portugueses, logo, tornou-se proveitosa eleitoralmente. Aqueles que teimaram em enfatizar a questão dos juros agiotas e a ocupação ilegítima das instâncias estrangeiras, foram totalmente derrotados.
Por fim, afirmar a minha total discordância pela centralidade e importância concedida à economia e à finança. Nestes últimos meses, anos, nada existe para além dessas duas grandes ciências exactas - grande ironia... "exactas". Erradamente a dimensão humanista desapareceu da praxis político-partidária. A política e os partidos foram colonizados por tais especialistas e depois, quando a coisa corre mal, é o medo. Medricas.
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