26 setembro 2020

a ciência e Portugal

A decadência portuguesa. Tem alguma explicação para esse fenómeno?

Não, não tenho. (...) Vou apenas circunscrever-me à minha área, que é a questão científica. Em primeiro lugar, não deteto uma decadência assim tão grande. A ideia de que não houve prática científica em Portugal no século XVII é exagerada. A prática científica em Portugal foi sempre modesta e não devemos fazer ficções sobre o passado. (...) Era possível pôr pessoas com baixos níveis educativos a fazer actividades cientificamente interessantes. Mas com o desenvolvimento da ciência, isto começou a ser impossível. As escolas exigiam grande qualidade. A partir do século XVII, ter bons cientistas, ou ter boas pessoas a fazer tarefas científicas (para não usar a palavra "cientista", que é do século XIX) obrigou a ter boas escolas. (...) Em Portugal isto foi sempre uma dificuldade, a existência de sistemas de ensino de boa qualidade, estáveis, duradouros. E no século XVII começou a notar-se.

( Henrique Leitão, entrevista à revista LER nº 156 - Inverno 2019-2020 )

desgraçada trindade

Hoje, no jornal Público, Pacheco Pereira é muito acertivo naquilo que escreve a propósito deste tríptico que nos desgraça enquanto comunidade.  

25 setembro 2020

envelhecendo

Sentado na cadeira do barbeiro, reparo no cabelo que me vai caindo, aos molhos, na bata que me envolve. Os cabelos mais escuros que ainda tenho são de uma claridade crescente, que poderia adjectivar de cinzentos ou prateados, não me consigo decidir. Mas não há como fugir à realidade: já não tenho cabelos escuros.

24 setembro 2020

bateu-nos à porta

Depois de todos aqueles meses confinados, depois de um desconfinamento com grandes reservas e cuidados, depois de todo um Verão sem poder ser Verão, depois das mil e uma preocupações com a higiene pessoal e da família, eis que o bicho nos bate à porta. Ainda não entrou, pelo menos oficialmente, mas já nos obrigou a isolamento profiláctico rigoroso, sem qualquer contacto pessoal e comunicação telefónica entre divisões da mesma habitação. Ainda que a causa deste possível contágio resulte de muita irresponsabilidade e incúria, por enquanto, prefiro não tecer qualquer comentário, nem identificar a situação. Aguardemos. Por hora, estamos bem. Hoje é o dia do primeiro teste da Covid e a ansiedade é grande. Vamos ver o que aí vem.

23 setembro 2020

o Outono

Não é segredo para ninguém, muito menos para aqueles que me rodeiam e conhecem, a minha preferência pelos ambientes mais frescos e até frios. Ainda que diferente de qualquer outro já experimentado, bem vindo seja o Outono e os seus humores temperamentais de luz, cor e aconchego. Assim sendo, é sempre um prazer ir ao guarda-fatos buscar os casacos e as camisolas, recolocar o guarda-chuva à mão de utilizar e aguardar pelas chuvas que hão-de vir.

21 setembro 2020

mediascape:golo

No fim-de-semana em que iniciou mais um campeonato nacional das ligas profissionais, o eco do descontentamento do sector pairou por toda a comunicação social, porque a DGS mantém os espectadores longe dos estádios de futebol e não se prevê uma alteração dessa restrição a curto prazo. Eu até entendo e aceito o desagrado e as terríveis consequências financeiras destas medidas e percebo que o universo do futebol esteja a sofrer como jamais sofreu. Claro que o futebol sem adeptos nas bancadas é uma merda, mas o coro que se faz ouvir parece que não entende (ou não quer entender) que são mais do que justificáveis as razões que impedem a presença de pessoas nos estádios. É que ao contrário de outras manifestações ou eventos de massas, o futebol tem um elemento explosivo que se chama GOLO! E é esse momento orgásmico quem prejudica a indústria do futebol. Como poderiam controlar centenas ou milhares de pessoas espalhadas por um estádio, nesse momento de alegre e efusiva manifestação? Impossível. Portanto, haja paciência e mantenham-se as portas dos estádios fechadas.

18 setembro 2020

reencontro

Hoje foi o dia em que a minha criança regressou à escola, depois de mais de seis meses de ausência. A expectativa do miúdo era grande, mas maior era a ansiedade e o turbilhão de sensações dos seus pais sobre este regresso. Admito que estou moderadamente pessimista em relação ao funcionamento das escolas neste contexto e estou consciente que a maioria das estruturas e equipamentos escolares não conseguem dar respostas satisfatórias às recomendações e exigências da DGS.

Nestes últimos dias, todas as dúvidas e questões ganharam relevância e, ainda ontem, comentava em família que aquilo que me apetecia fazer neste momento era pegar na família e refugiar-me num recanto qualquer, longe e afastados deste turbilhão contagioso. Infelizmente não temos essa possibilidade, mas seria a minha vontade, pelo menos até esta tempestade se afastar.

Entretanto, ao acompanhar o miúdo à escola e ao vê-lo no reencontro os seus colegas, alegres e felizes a falar e a brincar, todos essas dúvidas e questões em relação ao início do ano, se desvaneceram e, claro, o lugar deles é lá, na Escola, onde mais do que o conhecimento, importa a socialização, a brincadeira, os encontros e desencontros, para poderem ser crianças saudáveis e equilibradas. Viva a ESCOLA.

15 setembro 2020

jornadas culturais




Em breve por terras de Balsamão, eu vou lá estar para falar da Casa de Recolhimento das Oblatas do menino Jesus da Mofreita, no concelho de Vinhais. Será a minha primeira participação nestas Jornadas que vão já na sua vigésima terceira edição. Até lá.

08 setembro 2020

todos ao teatro

Ainda a propósito das tralhas que tenho para arrumar, encontrei o programa do Teatro Municipal de Bragança, agora dirigido pelo amigo João Cunha, para o último terço do ano 2020 (de Setembro a Dezembro), que o próprio me ofereceu num destes dias. Para além da qualidade do próprio programa que, apesar de variado e eclético, pode ser alvo de diferentes e variados juízos, retive o olhar na última página deste pequeno livreto que, para além da ficha técnica e ficha de preenchimento para receber informações regulares sobre as suas actividades, apresenta aquilo que são verdadeiros incentivos para a população frequentar este espaço cultural. Já não há desculpas para não ir ao teatro.

leituras e descanso

No momento em que arrumo as tralhas e me preparo para regressar a casa, depois de quase três semanas de descanso e também de trabalho de campo, verifico os livros que trouxe para a "cabeceira" e consegui ler. Não atingi o meu objectivo, mas fiquei apenas a um livro de o conseguir. Enfim, é tempo de regressar e organizar o que agora se colheu, para depois reiniciar as velhas rotinas. Vamos lá.

saudade e esperança

Quando mergulhamos em bibliotecas e arquivos somos, por vezes, surpreendidos por informações e dados inesperados, não expectáveis e até originais. Ao folhear livros e documentos antigos, não é raro encontrar pequenos papéis a servirem de marcadores, ou com pequenas notas ou apontamento, ou pagelas de santos e santinhas, mas desta vez o que encontrei num documento de 1845, foi esta pequena mensagem de saudade e esperança com cerca de trinta anos. Não consigo ficar indiferente e questiono: Terá sido esquecimento? Terá sido intencional? Qual seria a probabilidade de o destinatário encontrar esta missiva nesta selva de documentos históricos? Sempre bonito e intrigante.

ao léu

Mais um pedaço da vida de Luiz Pacheco ao léu. Leitura do serão passado, esta edição de António Cândido Franco que apresenta e comenta a correspondência de Pacheco para João Carlos Raposo Nunes, vem reforçar aquilo que eu penso sobre o Luiz Pacheco. Foi uma das escritas mais livres e criativas do século XX em Portugal. Desalinhado e anárquico, fez e desfez, abalou e escandalizou o mainstream literário e cultural nacional, com coragem e desassombro. Cada vez que o leio e cada vez que sei mais sobre a sua vida e escrita, fico com apetite para mais conhecer, e o tanto que ainda há para descobrir sobre o grande Pacheco.

02 setembro 2020

técnicas

Era uma técnica de meditação que eu usava na altura: pegava numa ideia, registava-a mentalmente num papel imaginário e, com ela na mão, revirava-a mentalmente, concentrando-me nela; depois amarfanhava-a numa bola e deitava-a fora.

David Means, in Granta nº5 (Maio 2020)

01 setembro 2020

numa rádio, às vezes perto de mim



mediascape: abjecta

A notícia do dia, a correr nas edições online dos media e nas redes sociais, é um abaixo-assinado a favor do respeito pela objecção de consciência dos pais que não queiram que os seus filhos frequentem a disciplina de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento. Assinaram este bolorento documento, para além dos seus promotores Manuel Braga da Cruz e Mário Pinto, cerca de cem personalidades portuguesas, entre elas, Cavaco Silva, Pedro Passos Coelho, D. Manuel Clemente, Pedro Lomba, Miguel Morgado, Rui Machete, Manuela Ferreira Leite, António Bagão Felix, Adriano Moreira, José Ribeiro e Castro e até o socialista(?!) Sérgio Sousa Pinto. Este grupo peticionário muito homogéneo e conservador insurge-se contra a imposição e a obrigatoriedade da frequência e avaliação dessa disciplina no Curriculum da Escola Pública, alegando falta de liberdade para os pais nas escolhas educativas e uma imposição do Estado em algo que é competência da família.

Programa curricular da disciplina Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento.

Pois bem, tendo em conta o programa curricular conhecido dessa disciplina, aqui reproduzido, onde podem estas luminárias encontrar motivos para objecção de consciência?! Estou mais certo e convencido que aquilo que estes reumáticos mentais pretendem é promover um retrocesso civilizacional e que as liberdades civis que temos vindo a conquistar não se consolidem na sociedade e que um dia possam ser revertidas. Abjecta a consciência destes peticionários.

tem razão, sim senhora

jornal Público de 1 de Setembro de 2020

eis a questão

Aproveitando o embalo do último post, partilho a minha preocupação imediata: a aproximação do início do ano lectivo e as incertezas que me assaltam sobre aquilo que vai acontecer. Tenho estado atento a tudo quanto é dito e escrito sobre o assunto - comunicações oficiais da DGS e do Governo, opiniões publicadas e opiniões avulsas de amigos e conhecidos - e não consigo vislumbrar uma estratégia, uma linha de pensamento segura e acertiva sobre o assunto. A minha criança vai para a escola daqui a quinze dias e ainda não fomos informados de nada: horários, turmas, intervalos, cantina, regulamentos de funcionamento, planos de contingência, medidas de segurança individuais, etc.. São inúmeras as questões e as dúvidas, e nesta incerteza continuo a ponderar não deixar o meu filho ir à escola. Bem sei que não posso mantê-lo refém deste vírus para toda a vida, mas mantenho a minha perspectiva de que é mais importante proteger-lhe a saúde do que expô-lo a riscos desnecessários apenas e só pelo benefício da aprendizagem. Não haverá qualquer perda, se não aprender este ano, aprenderá no próximo. Terá toda a sua vida para o conhecimento.

uma mudança de época

Ontem à noite lia o último jornal de Letras e, nas suas páginas 25 e 26, encontrei um texto de Fernanda Henriques sobre a actual e urgente necessidade de mudança de paradigma, com a revalorização do trabalho das mulheres e a com a ideia de uma economia do cuidado, remetendo e revisitando o pensamento de Maria de Lourdes Pintasilgo. De facto, num contexto de crise global provocada pela Covid, que para além dos problemas de saúde pública, veio evidenciar as fragilidades do nosso modo de vida - capitalista, consumista, globalizado. Tal como já aqui reflecti várias vezes nos últimos meses e já muitos outros o disseram e escreveram, teremos mesmo que parar para repensar naquilo que ambicionamos para a nossa vida e para o nosso planeta. Penso e espero que este não seja apenas um interlúdio temporal para depois regressarmos ao mesmo consumismo desenfreado e irresponsável; espero que esta pandemia que se globalizou seja um ponto sem retorno e permita a mudança de paradigma naquilo que é o entendimento do mundo e que possamos baixar a febre de felicidade imediata e a todo o custo, medida em unidades do PIB, que avassala o planeta (Viriato Soromenho-Marques, no mesmo jornal de Letras - nº 1302). Teremos que pensar "fora da caixa" e libertar-nos das sedutoras e irresistíveis amarras dos consumos imediatos. Ao contrário do que nos tentam fazer crer, é possível existir sem tanta oferta, sem tanto lixo, sem tanta poluição, basta para isso procurar conceber novas estruturas conceptuais para a vida de cada um de nós e, depois, para as comunidades. Procuremos então, e com afinco, uma nova época para um futuro possível para aqueles que nos hão-de sobreviver.