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21 fevereiro 2022

coitados dos turistas

(na capa do Jornal de Notícias de 20/02/2022)

Foi notícia no Jornal de Notícias deste Domingo (20/02/2022), com chamada na capa da edição - Drama dos sem-abrigo choca turistas (pp. 18 e 19). De facto, a situação é muito preocupante, é dramática e é triste, mas não é uma situação nova, pois quem deambule pela baixa da cidade do Porto, já há muito tempo que convive com esses inquilinos do espaço público que, durante todo o ano, ocupam recantos dos edifícios públicos e privados e se fazem notar não só pela sua presença, como pela parafernália que arrastam consigo ou deixam como reserva do espaço que habitam. A crer na notícia agora publicada serão cerca de 500 pessoas nesta condição. 500 pessoas!
A notícia, para além do mais que necessário alarme para a dramática situação, está, no meu entendimento, toda ela escrita sob um prisma errado, enfatizando a perspectiva de todos os implicados - comerciantes, turistas, ONG's e autarquia - menos a daqueles que sofrem nas suas vidas essa condição de sem-abrigo, ainda que sejam referidos dois ou três destes casos.
Claro que o impacto desta situação prejudica não só a imagem da cidade, como algumas das actividades económicas que aí se desenvolvem, mas não é apresentada qualquer solução para este problema, que é muito mais do que uma situação de saúde pública, é uma questão de civilidade e dignidade da própria comunidade. Sinceramente, afirmá-lo como um problema para o turismo e para os turistas que nos visitam?! Que raio. Por outro lado, este texto também não consegue ultrapassar a visão de uma sociedade caritativa, que depende da boa vontade e voluntarismo de um conjunto de cidadãos e de algumas organizações não-governamentais, como sendo essa a solução para o problema. Não é. A responsabilidade para resolver, ou pelo menos, minorar este cenário é do Estado e das suas instituições, nomeadamente da Segurança Social e, depois, das autarquias que têm, pelo conhecimento do terreno e proximidade com estas populações, a obrigação de criar as condições mínimas e capazes de retirar esta gente da rua e da indigência.
Bem sei que não é fácil e é complexo, que cada um deste indivíduos tem as suas idiossincrasias (doenças, traumas, violências e dependências) naquilo que é a sua história de vida e, portanto, o esforço terá que ser assíduo, persistente e duradouro. Não é admissível que a autarquia do Porto, na pessoa da Vereadora da Acção Social, Cristina Pimentel, ao ser questionada pelo J.N., responda: ao contrário da percepção que existe em quem circula pelas ruas, a população sem-abrigo não aumentou. Senhora vereadora, essa afirmação soa a satisfação por o número não ter aumentado, como se cerca de 500 pessoas a dormir nas ruas da cidade não fosse já uma enormidade, uma tragédia. Mais, está equivocada, porque para quem gere ou administra a coisa pública e a polis, a percepção, ou melhor, as percepções daqueles que vivem e fazem ser a cidade são importantes e a razão da existência do seu lugar na administração pública local.
Mas é também, uma peça jornalística que reforça uma visão da cidade que se impôs nas últimas décadas, na qual o espaço e os lugares só existem, só fazem sentido, se estiverem ao serviço da especulação imobiliária (gentrificação), ao dispor dos fluxos e preferências/modas sazonais e consumos do turismo (turistificação) e a vida dos habitantes é preterida para a insignificância ou expulsa para a periferia (reificação). Era este o Porto de Rui Rio e é este o Porto de Rui Moreira. É tempo de alterar o paradigma, de dignificar a vida destes (e de todos os) cidadãos e de redireccionar a cidade para servir quem nela vive, trabalha, ou tenta sobreviver.
Enfim, não me interessa, não quero saber do incómodo dos turistas que nos visitam, quero é solução para cada uma destas quinhentas vidas que, voluntária ou involuntariamente, permanecem num estado de indignidade humana.

10 fevereiro 2022

diz-se por aí


É este o resultado de andarmos a brincar às privatizações de sectores estruturais e estratégicos do nosso país. A gestão privada é que é boa, muito melhor do que a pública, diz-se por aí e sem pudor. Como pode a água, que é um bem essencial e um direito fundamental que cada cidadão tem, ser privatizada e a sua gestão ser objecto de especulação, cujo único propósito é a obtenção de lucro?! Como pode haver gente - e aqui falo de presidentes de Câmaras Municipais e demais organismos municipais, partidos políticos e agentes sociais - que decida que a água deve ser explorada por uma empresa privada, cuja finalidade é a obtenção de lucro? Esse executivo camarário que assinou, em 2004, o contrato de concessão deveria ser criminalmente responsabilizado. Foi um crime! É um crime! Não podemos aceitar esta lógica liberalizadora na nossa sociedade, pois se assim for, quando dermos conta estaremos a pagar o ar que respiramos.

04 fevereiro 2022

maioria absoluta

Não foi preciso esperar muitos dias depois das eleições e delas ter resultado uma maioria absoluta, para o PS começar a governar o Estado a seu bel-prazer, sem se preocupar com o que seja, sem olhar para o lado e sem, reparem bem no preciosismo, se preocupar com aquilo que estava anteriormente negociado com o PC e o BE.


De acordo com o jornal Expresso as linhas gerais mantêm-se, mas com alguns retoques como a criação de dois novos escalões no IRS, com um pequeno desagravamento do imposto ou aumento mínimo de 10 euros nas pensões. Mas o que chama à atenção são sobretudo as ausências, exemplo disso é o englobamento das mais-valias mobiliárias no IRS. Aplicava-se aos portugueses que fazem parte do último escalão de IRS, ou seja, com um rendimento coletável acima dos 75 mil euros e que nos últimos 12 meses tenham obtido rendimentos com bens móveis, tais como ações ou obrigações. O partido socialista justifica-se e diz que a aplicação da proposta depois da aprovação do novo orçamento ia criar problemas legais, dado que seria obrigatório cobrar o imposto com retroativos a janeiro. A medida foi exigida pelos parceiros da antiga geringonça, especialmente o PCP, mas nunca reuniu consenso entre os socialistas.
(in https://expresso.pt/expresso)


Aqui está um caso paradigmático daquilo que será a governação do todo-poderoso António Costa, perante a total incapacidade dos demais partidos beliscarem a sua vontade. Sim senhor. Maiorias absolutas é para isto que servem e foram, são e serão sempre, mais prejudiciais às democracias do que aquilo o próprio Primeiro Ministro diz querer normalizar. Não me restam dúvidas de que este governo vai-se deslocar para a direita e, sem os partidos da sua esquerda a pressionar, obedecerá à agenda dos interesses corporativos e patronais, em detrimento da agenda de maior justiça social e laboral. Cá estaremos para ir registando e denunciando as clivagens à direita e ao neo-liberalismo que se vão operar nos próximos tempos.

31 janeiro 2022

idiotas úteis *

Na ressaca das eleições legislativas de ontem, nas quais o PS conseguiu uma clara e inequívoca maioria absoluta, importa-me reflectir sobre o resultado da minha família partidária. Apesar desta maioria do PS ter provocado uma tempestade de maus resultados em todo o espectro partidário, o maior derrotado foi, não tenho dúvidas, o Bloco de Esquerda.
E aquilo que mais me incomoda a amígdala é a sensação de que os seus dirigentes estão em negação e não percebem aquilo que, por culpa própria, lhes aconteceu. Na minha modesta e humilde opinião, o resultado desastroso de ontem, em que passámos de um grupo parlamentar de 19 para um grupo parlamentar de 5 deputados; mais, em que só elegemos em Lisboa (2), no Porto (2) e em Setúbal (1), teve origem na péssima decisão de terem votado contra o Orçamento de Estado e, em consequência, provocado estas eleições. Ainda hoje não consigo entender o leitmotiv dessa decisão... é que:
a) O Bloco tinha um grupo parlamentar de 19 deputados;
b) Na Assembleia da República existia uma confortável maioria de esquerda;
c) O PS, sem maioria, estava obrigado a negociar com os demais partidos, ou seja, o Bloco de Esquerda podia influenciar a governação do país;
Pelos vistos, para os dirigentes e inteligências do Bloco essa realidade não satisfazia, não era suficiente, e servindo-se de um argumento contra-producente - que o PS não estava interessado em negociar e queria ir para eleições - chumbou o orçamento, comportando-se precisamente como o PS e António Costa pretendiam. Se sabiam que essa era a vontade de António Costa, o BE só podia ter contrariado, abstendo-se na votação do orçamento, obrigando o PS a governar e a continuar a negociar cada política, cada lei, cada medida ou acção e, assim, o ónus da crise política não caía em cima do Bloco.
Só que não, convencidos não sei do quê, completos idiotas úteis, fizemos o trabalho sujo ao PS e arcámos com a responsabilidade da crise política (em parceria com o Partido Comunista), para então António Costa, com mestria, construir a narrativa que mais lhe interessava - a da vitimização às mãos dos partidos à sua esquerda. Parabéns, pois conseguiu todos os seus objectivos: derrotar o PSD, ter uma maioria absoluta e, sem dó e piedade, humilhar o Bloco e a CDU.
Aquilo que hoje gostaria de perguntar aos dirigentes do Bloco - cuja existência reside algures no etéreo universo do parlamento e desligado das suas estruturas e bases, assim como alheada cada vez mais da realidade da vida de rua, dos trabalhadores e dos portugueses - era: Se o anterior orçamento não servia aos portugueses e por isso foi chumbado, o próximo, construído e suportado por uma maioria parlamentar do PS, é que merecerá o apoio do Bloco? Brincaram com o fogo, queimaram-se e as cicatrizes demorarão pelo menos 4 anos a sarar.
Mais, o grupo parlamentar do BE precisa ser renovado, pois independentemente da qualidade daqueles que lá estiveram e dos poucos que se mantêm, já lá estão à tempo a mais. Quantas legislaturas já fez cada um dos eleitos pelo BE? José Soeiro, Catarina Martins, Pedro Filipe Soares, Mariana e Joana Mortágua? Não será já o tempo de termos caras novas, com ideias novas e que tragam um rejuvenescimento ao grupo parlamentar? Por último, a coordenação do Bloco também precisa de um rosto novo. A Catarina Martins, que tanto fez pelo partido, pela democracia e pelo país, também está na coordenação há muito tempo. O seu discurso já não entusiasma, não é capaz de seduzir gente de fora do movimento, o que se tem traduzido em sucessivas derrotas eleitorais.
Idiotas úteis e ainda por cima esquizofrénicos e em negação. Mau demais.

* Esta expressão ouvia ontem, no decorrer da noite eleitoral, da boca de um dos comentadores que assim adjectivou os partidos à esquerda do PS (Bloco e PC).

28 janeiro 2022

ainda assim espero estar enganado

Termina hoje a campanha eleitoral para as eleições legislativas que irão acontecer no Domingo, dia 30 de Janeiro de 2022. Durante este longo período desde o chumbo do orçamento e o "derrube" do governo, procurei estar atento, ainda que à distância, mas sempre preocupado e receoso do resultado da eleição. É que apesar de não gostar do governo PS e até aceitar que foi António Costa quem não quis negociar e chegar a acordo com os partidos à sua esquerda e, assim, preferir ir para eleições, não aceito que digam que os governos do PS são iguais ou parecidos aos governos da direita. A ideia vastamente difundida, em jeito de justificação para as opções escolhidas, nos partidos de esquerda de que o PS não é de esquerda, não é verdadeira. Caramba, é preciso não ter memória e não ter qualquer sensibilidade pelo sofrimento de tantos e tantos portugueses para se afirmar que PS é igual a PSD.
Continuo a não perceber porque é que o BE votou contra o orçamento e, assim, derrubou o governo. Tanto mais que se é verdade que foi o primeiro-ministro quem não quis governar naquelas condições, mais uma razão para o contrariar e ter aprovado (por abstenção) o referido orçamento.
Não participei em nenhuma actividade ou acção do meu partido. Não gosto do que ouço, do que leio e da atitude dos dirigentes do BE, cujas ideias e mensagens, transmitidas ao longo destes dias, têm sido contraditórias, difusas e confusas para o comum dos mortais... não gosto da atitude de agressão aos demais partidos da esquerda e centro esquerda, em detrimento do ataque os partidos da direita, esses sim, verdadeiros adversários políticos.
O meu voto está mais do que garantido e não tenho dúvidas, mas continuo a considerar que à esquerda do PS vive-se uma tremenda esquizofrenia. Sei o que quero: quero uma maioria de esquerda no parlamento que aí vem, com representação de todos os partidos que se candidatam e sei o que não quero: não quero um governo de direita. A realidade é que não tenho a certeza que o PS vença e forme governo e isso deixa-me triste e muito preocupado com os dias que hão-de vir. Ainda assim, espero estar enganado.

23 julho 2021

o incrédulo entre nós

Ainda a propósito das trágicas inundações na Alemanha e Bélgica da última semana, encontrei no Twitter um testemunho de uma vítima deste cataclismo natural, que incrédula afirmava:

-Não esperávamos que morressem na Alemanha pessoas vitimas de inundações. Isso acontece nos países pobres.

Esta declaração é todo um tratado sobre a perspectiva, eu diria mesmo, a crença que a esmagadora maioria dos cidadãos europeus têm sobre o seu privilégio, conforto e qualidade de vida comparativamente a outras latitudes e longitudes. Esta visão euro-cêntrica acompanha-nos há séculos e é também reveladora do alheamento face aos problemas do mundo e, em particular, dos gravíssimos problemas ambientais que também são culpa dos Estados europeus, das suas empresas e do seu modo de vida. Esta vítima, que viu o absurdo e o impensável cair-lhe do céu, considerava o seu conforto e bem-estar um direito quase divino e que o desenvolvimento económico e civilizacional seria um escudo protector e indulgente para toda e qualquer agressão ambiental. Acabou o tempo da tolerância e aqueles que mandam no mundo têm mesmo que repensar e alterar o comportamento dentro desta nossa casa que é o mundo. Os avisos têm sido frequentes e impactantes. Não há espaço, nem tempo, para hesitações, se não depois poderá ser já tarde demais.

23 junho 2021

desconfinamento desconfiado

É verdade que há já quase dois meses começámos a por o pé na rua, regressámos aos locais de trabalho e a vida em comunidade deu sinais de alguma reanimação, mas tal como em momentos anteriores de desconfinamento, foi Sol de pouca dura e, mesmo que o céu tenha estado sempre encoberto por grandes nuvens cinzentas, muitos consideraram que a tempestade findara, saíram à rua e quiseram viver como se nenhum perigo existisse. Mais do que esta atitude irresponsável de muitos, aquilo que mais me irrita é a atitude passiva, negligente e irresponsável das autoridades nacionais que, sem qualquer razão ou justificação, permitiram e promoveram um conjunto de acções e momentos impossíveis - festejos do campeonato do Sporting, final da Liga dos Campeões Europeus no Porto, manifestações e concentrações de pessoas em festas, comícios, estádios, etc. - e que agora, pouco tempo depois, resultaram num novo crescimento de todos os indicadores relativos à Covid-19, falando-se já numa 4ª vaga da pandemia a caminho, que nos irá atingir em pleno Verão. Vai ser bonito... temperaturas altas e as pessoas fechadas em casa a cozer e a derreter o cérebro. Eu espero estar enganado, mas permaneço desconfiado e tudo aquilo que desconfinei até aqui foi muito pouco, sempre com a perspectiva de que a inversão de marcha era uma hipótese muito possível. Apesar de sair de casa, continuo a não me sentir confortável em lado nenhum, e também por isso, não projectei nada (férias, viagens, passeios) para este tempo estival e estou mais do que preparado para me enclausurar em casa, outra vez.

22 janeiro 2021

Joe Biden e o crápula

Já está. O ignóbil saiu pela porta pequena da Casa Branca e foi para o seu feudo tomar conta dos porcos e galinhas. Joe Biden tomou posse, num acto de simplicidade democrática e, ao assistir ao evento, a memória destes últimos quatro anos mais pareciam um sonho mau. Não foi um sonho, mas uma realidade má, que felizmente os americanos puseram cobro. Não tenho grande ilusões face à nova administração, mas pelo menos, ficou o alívio e a satisfação de a democracia ter vencido a mentira, a distopia e, acima de tudo, o crápula desqualificado e toda a seita de negacionistas, conservadores e radicais supremacionistas.
Ainda assim, passadas pouco mais de 48 horas sobre a tomada de posse, é bom saber que de imediato Joe Biden reverteu um conjunto de medidas-bandeira da anterior administração e do chamado "trumpismo". Com a assinatura de vários decretos, o novo presidente reverteu, por exemplo:

- EUA regressam ao Acordo de Paris (combate às alterações climáticas);
- Destruiu o muro em construção entre os EUA e o México;
- Impôs a obrigatoriedade do uso de máscaras e distanciamento social em todos os espaços e instituições federais (protecção e combate à Covid-19);
- Cancelou o estado de emergência até então em vigor;
- revogação das autorizações para a construção do oleoduto Keystone XL; o regresso dos limites às emissões poluentes na indústria automóvel; ou a suspensão das concessões para a exploração de petróleo e gás no Refú- gio Nacional de Vida Selvagem do Árctico;
- Suspendeu por 100 dias o repatriamento de imigrantes considerados ilegais;
- pôs fim à proibição de entrada a cidadãos de países de maioria muçulmana;

Estes foram alguns dos decretos que Joe Biden assinou nas primeiras horas do seu mandato, destruindo de uma só vez o completo e perfeito disparate que o seu antecessor foi produzindo ao longo do seu mandato. Ainda há esperança para a democracia e para o mundo.

07 janeiro 2021

mediascape: distopia

As imagens que nos chegaram ontem de Washington são de tal forma irreais que não consigo encontrar melhor exemplo de uma distopia na contemporaneidade. Aquela que se afirma como a maior democracia do mundo, o país de todas as liberdades e oportunidades, afinal tem pés de barro. Como foi possível um bando de energúmenos invadirem e vandalizarem o coração da federação democrática dos EUA? As imagens que vimos não foram bonitas e são significativas do estado de grande fragilidade em que as instituições americanas se encontram, obra e graça do desqualificado presidente Trump que, em apenas quatro anos, conseguiu destruir alguns dos pilares democráticos que jamais imaginamos ser possível pôr em causa. Enfim, acredito que a democracia há-de sobreviver a este caos institucional e que os EUA regressarão a uma determinada normalidade. Donald Trump vai querer arrastar o país para um caos insuportável até ser despejado da Casa Branca, por isso, tudo o que possa vir a acontecer até lá não poderá ser surpresa para ninguém. Estamos a assistir ao estertor de um crápula ignóbil.

27 dezembro 2020

dia D

Hoje é o dia D da vacinação para a Covid-19 em Portugal. Um dia assinalável e, esperamos, memorável. Irá ser um processo lento e moroso, mas importa salientar o esforço e a dedicação de todos quantos estiveram nesta luta desigual desde o início. Está o mundo eufórico com este novo momento que marca o princípio do fim desta terrível pandemia e assinala igualmente um feito jamais alcançado de produção de uma vacina em tão curto espaço de tempo. É de facto incrível o que a Ciência pode fazer pelo Ser Humano. É em momentos como este, de afirmação, que deveríamos todos reflectir sobre a importância da Ciência na qualidade de vida que usufruímos e aproveitarmos para contribuir para derrubar todos os mitos, preconceitos e equívocos que teimam a sobreviver em muitas cabeças (pouco) pensantes. É uma vitória da Razão sobre a ignorância e sobre o dogma. Viva a Ciência.


Nesta fotografia, Marta Temido, a Ministra da Saúde, apresenta publicamente a vacina da Pfeizer que ontem chegaram, pela primeira vez, a Portugal. Um momento histórico e se há pessoa que merecerá todo o reconhecimento e gratidão pelo que fez ao longo de todo este tempo é ela. Muito bem.

16 dezembro 2020

mediascape: predisposição

Hoje, no jornal Público, e a propósito das eleições presidenciais e da situação pandémica que vivemos, é apresentada uma sondagem para o Público e RTP na qual são incluídos alguns indicadores muito reveladores das nossas percepções da realidade que experimentamos actualmente. Em relação aos números ou percentagens dos candidatos, pouco ou nada há a dizer ou comentar. Agora, em relação à pandemia não posso deixar de assinalar os dados agora conhecidos:


No primeiro gráfico, relativo à vacinação é evidente uma maioria clara de pessoas disponíveis e com vontade de serem vacinados, o que significa que felizmente e ao contrário daquilo que alguma, pouca inteligência nacional, quer fazer crer, já para não falar dos cavaleiros do apocalipse e das teorias da conspiração que populam pelas nacionais redes sociais.
Em relação ao segundo gráfico, ainda mais conclusivo e evidente, não restam dúvidas que os portugueses concordam com as medidas que a DGS e o Governo têm ditado para o país. Isto também contrariando muita da opinião publicada nos últimos meses, por aqueles que acham desde o início da pandemia que os portugueses estavam contra os sucessivos estados de emergência decretados. Pois bem, eu julgo que a maioria dos portugueses, tal como eu, não querem ser infectados pelo Coronavirus, nem querem correr riscos desnecessários. Ainda que por aí andem umas bestas irresponsáveis e negacionistas, pedem-nos para ficar em casa, só temos é que em casa ficar. É simples.
No terceiro e último gráfico, verificamos uma relativa contradição face ao segundo gráfico. Se por um lado a esmagadora maioria concorda com os estados de emergência, uma relativa parte dessa maioria não quer maiores restrições no Natal e concorda com a livre circulação entre concelhos e os habituais encontros familiares. Preocupante, digo eu.
Dia 18 de Dezembro, o Primeiro Ministro irá dirigir-se ao país para comunicar aquilo que poderemos ou não fazer durante o período das festividades natalícias. Espero que a razão não seja abandonada e que não haja cedência aos apelos mais emocionais e afectivos. Aquilo que não precisamos de todo agora é da "demissão" dos nossos responsáveis pelo combate à pandemia. Mais do que nunca, para não morrermos na praia. 

04 dezembro 2020

o plano de vacinação

Foi conhecido ontem o plano nacional de vacinação da Covid-19 preparado pela task-force responsável pela elaboração do mesmo. Não assisti à conferência de imprensa de apresentação do plano, mas já tive oportunidade de o conhecer e não posso deixar de dizer que, de uma forma geral, parece-me muito bem construído e preparado, naquilo que são as diferentes fases, as prioridades, os objectivos e os grupos de maior risco, já identificados e que terão prioridade no acesso à vacina. Não consigo perspectivar alternativas a esta proposta. Também me parece muito bem que a sua gestão seja centralizada na DGS e que a distribuição e vacinação, pelo menos, nas primeiras fases, seja realizada através dos Centros de Saúde. É claro que tudo isto é ainda uma planificação em papel e só quando se passar à operacionalização no terreno é que vamos saber se a estrutura do Serviço Nacional de Saúde conseguirá dar resposta a uma missão desta envergadura. Vai ser um processo longo e demorado. Aos portugueses só nos resta ter paciência, manter as regras estabelecidas para combater o vírus e aguardar pela nossa vez de sermos vacinados.

30 novembro 2020

expectativa, ilusão ou falsa esperança?

Espero, sinceramente, estar enganado e esta percepção ser mais resultante do meu mau feitio e do moderado pessimismo relativamente à pandemia.
Já todos devem ter reparado que de há uma ou duas semanas a esta parte, os media iniciaram uma campanha informativa sobre a proximidade da existência de uma, ou várias vacinas para combater a COVID-19 e avançam já com os planos de distribuição e aplicação dessas vacinas, com previsões de quantidades, estratégias de distribuição, locais de vacinação, grupos prioritários, entre outros pormenores, que me parecem extemporâneos. A verdade é que os próprios governos de vários países europeus, e não só, embarcaram nesta lógica de antecipação informativa, transmitindo ideias contraditórias e pouco precisas, que demonstra bem a ansiedade de toda a gente face à possibilidade de uma eminente cura para esta terrível doença.
Eu não sei o que vai acontecer, nem quando vai acontecer, mas precavido que estou, desconfio desta vertigem informativa. Estarão mesmo as vacinas em vésperas de serem aplicadas à população? Essa distribuição e vacinação irá iniciar neste curto espaço de tempo que tem sido anunciado? Estarão criadas as condições logísticas suficientes e capazes de dar resposta à dimensão desta operação? E por último, será a vacina eficaz e capaz de derrotar definitivamente o raio do vírus? Como vêem são demasiadas as perguntas e dúvidas que ainda não vi satisfatoriamente respondidas e esclarecidas na polifonia das televisões, dos jornais, dos opinadores e afins.

03 novembro 2020

um dia importante

Hoje é um dia importante para todos nós. Todos nós que vivemos neste mundo. Bem sei que é um lugar comum, mas as eleições presidenciais nos EUA foram, são e serão sempre um momento relevante para a nossa existência e têm repercussões globais. Espero e desejo ver o desqualificado inquilino da Casa, que dizem ser Branca, corrido de lá para os seus domínios do Show Business, habitado pelas fake news, pela junk food e pela trash people, de onde nunca o deveriam ter deixado sair. Não é tarefa simples e até ao lavar dos cestos será sempre vindima. Joe Biden não me entusiasma a amígdala, mas será a única escolha possível se os americanos quiserem regressar a uma qualquer normalidade que este analfabeto e inábil tem vindo a destruir desde 2016. God bless America.

02 novembro 2020

no fio da navalha

A propósito da declaração do Primeiro-Ministro no final do Conselho de Ministro, no passado Sábado, e as posteriores reacções e comentários que, incessantes, se vão ouvindo nos media, eu, que assisti em directo a essas declarações, não consigo ser crítico do comportamento e do discurso de António Costa e seu Governo - foi explícito e, principalmente, foi pedagógico. Claro que tem havido erros de gestão da pandemia, má comunicação, informações contraditórias, mas caramba, estamos numa situação impossível de gerir. Já aqui o disse e vou repetir: respeito e admiro muito aqueles(as) que têm dado a cara e estão ao leme desta situação desde o início da pandemia, pois sendo uma realidade extrema, nova e de uma intensidade tal, é de uma injustiça gritante estar sempre a criticar, ainda por cima, sem apresentar alternativas. Percebeu-se nas palavras de António Costa uma tremenda incerteza sobre o que aí vem, foi notório o desconforto com a atitude irresponsável de muitos portugueses e foi perceptível o fio da navalha em que o Governo e demais instituições responsáveis se encontram neste momento. Serão sempre decisões difíceis que implicarão consequências gravíssimas para a nossa sociedade. Respeito.

25 outubro 2020

um novo início

O título destas linhas terá dois sentidos ou duas possíveis significações. Por um lado, a pandemia que teima em nos cercar e sitiar, obriga-nos a reforçar cuidados e a reiniciar processos e rotinas que se julgavam ser já pretérito; por outro lado, esta grande incerteza naquilo que é o nosso presente, faz-nos questionar se algum dia iremos ter acesso a uma qualquer normalidade livre e a salvo deste maldito vírus.
Esta pequena reflexão, que me tem acompanhado nos últimos dias, deixa-me inquieto e, ao mesmo tempo, resignado. Inquieto porque estou saturado desta clausura auto-imposta e resignado porque tenho consciência, face aos números actuais da pandemia em Portugal e no resto da Europa, de que não haverá alternativa a um novo confinamento imposto por lei e para a totalidade do país.
Hesito se devo, ou melhor, se quero iniciar aqui uma segunda série de textos "enclausurado", dedicados a essa experiência pessoal que foi o primeiro confinamento. Irei aguardar mais uns dias para perceber o desenvolvimento da situação pandémica e as consequentes medidas das nossas autoridades.
Relembrando as palavras de George Steiner, pergunto-me: Teremos nós direito a um novo início?

21 setembro 2020

mediascape:golo

No fim-de-semana em que iniciou mais um campeonato nacional das ligas profissionais, o eco do descontentamento do sector pairou por toda a comunicação social, porque a DGS mantém os espectadores longe dos estádios de futebol e não se prevê uma alteração dessa restrição a curto prazo. Eu até entendo e aceito o desagrado e as terríveis consequências financeiras destas medidas e percebo que o universo do futebol esteja a sofrer como jamais sofreu. Claro que o futebol sem adeptos nas bancadas é uma merda, mas o coro que se faz ouvir parece que não entende (ou não quer entender) que são mais do que justificáveis as razões que impedem a presença de pessoas nos estádios. É que ao contrário de outras manifestações ou eventos de massas, o futebol tem um elemento explosivo que se chama GOLO! E é esse momento orgásmico quem prejudica a indústria do futebol. Como poderiam controlar centenas ou milhares de pessoas espalhadas por um estádio, nesse momento de alegre e efusiva manifestação? Impossível. Portanto, haja paciência e mantenham-se as portas dos estádios fechadas.

18 setembro 2020

reencontro

Hoje foi o dia em que a minha criança regressou à escola, depois de mais de seis meses de ausência. A expectativa do miúdo era grande, mas maior era a ansiedade e o turbilhão de sensações dos seus pais sobre este regresso. Admito que estou moderadamente pessimista em relação ao funcionamento das escolas neste contexto e estou consciente que a maioria das estruturas e equipamentos escolares não conseguem dar respostas satisfatórias às recomendações e exigências da DGS.

Nestes últimos dias, todas as dúvidas e questões ganharam relevância e, ainda ontem, comentava em família que aquilo que me apetecia fazer neste momento era pegar na família e refugiar-me num recanto qualquer, longe e afastados deste turbilhão contagioso. Infelizmente não temos essa possibilidade, mas seria a minha vontade, pelo menos até esta tempestade se afastar.

Entretanto, ao acompanhar o miúdo à escola e ao vê-lo no reencontro os seus colegas, alegres e felizes a falar e a brincar, todos essas dúvidas e questões em relação ao início do ano, se desvaneceram e, claro, o lugar deles é lá, na Escola, onde mais do que o conhecimento, importa a socialização, a brincadeira, os encontros e desencontros, para poderem ser crianças saudáveis e equilibradas. Viva a ESCOLA.

01 setembro 2020

mediascape: abjecta

A notícia do dia, a correr nas edições online dos media e nas redes sociais, é um abaixo-assinado a favor do respeito pela objecção de consciência dos pais que não queiram que os seus filhos frequentem a disciplina de Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento. Assinaram este bolorento documento, para além dos seus promotores Manuel Braga da Cruz e Mário Pinto, cerca de cem personalidades portuguesas, entre elas, Cavaco Silva, Pedro Passos Coelho, D. Manuel Clemente, Pedro Lomba, Miguel Morgado, Rui Machete, Manuela Ferreira Leite, António Bagão Felix, Adriano Moreira, José Ribeiro e Castro e até o socialista(?!) Sérgio Sousa Pinto. Este grupo peticionário muito homogéneo e conservador insurge-se contra a imposição e a obrigatoriedade da frequência e avaliação dessa disciplina no Curriculum da Escola Pública, alegando falta de liberdade para os pais nas escolhas educativas e uma imposição do Estado em algo que é competência da família.

Programa curricular da disciplina Educação para a Cidadania e o Desenvolvimento.

Pois bem, tendo em conta o programa curricular conhecido dessa disciplina, aqui reproduzido, onde podem estas luminárias encontrar motivos para objecção de consciência?! Estou mais certo e convencido que aquilo que estes reumáticos mentais pretendem é promover um retrocesso civilizacional e que as liberdades civis que temos vindo a conquistar não se consolidem na sociedade e que um dia possam ser revertidas. Abjecta a consciência destes peticionários.

eis a questão

Aproveitando o embalo do último post, partilho a minha preocupação imediata: a aproximação do início do ano lectivo e as incertezas que me assaltam sobre aquilo que vai acontecer. Tenho estado atento a tudo quanto é dito e escrito sobre o assunto - comunicações oficiais da DGS e do Governo, opiniões publicadas e opiniões avulsas de amigos e conhecidos - e não consigo vislumbrar uma estratégia, uma linha de pensamento segura e acertiva sobre o assunto. A minha criança vai para a escola daqui a quinze dias e ainda não fomos informados de nada: horários, turmas, intervalos, cantina, regulamentos de funcionamento, planos de contingência, medidas de segurança individuais, etc.. São inúmeras as questões e as dúvidas, e nesta incerteza continuo a ponderar não deixar o meu filho ir à escola. Bem sei que não posso mantê-lo refém deste vírus para toda a vida, mas mantenho a minha perspectiva de que é mais importante proteger-lhe a saúde do que expô-lo a riscos desnecessários apenas e só pelo benefício da aprendizagem. Não haverá qualquer perda, se não aprender este ano, aprenderá no próximo. Terá toda a sua vida para o conhecimento.