A humanidade moderna, armada pela desmesura tecnocientífica, transformou-se na maior força plástica operante na Terra. Uma força tão irracional, primitiva e moralmente neutra como um furacão, um terramoto, ou um asteróide atraído pelo campo gravitacional do nosso planeta. Ninguém pensou a verdade do nosso tempo. Longe de ser um processo cultural milenar, associado à filosofia idealista e ao monoteísmo, o niilismo transformou-se no ponto de convergência da história humana.
A humanidade ocidental, que nas suas representações culturais e tecnológicas hoje se confunde com a humanidade inteira, transformou a religião do progresso na febril vertigem da destruição de uma Terra que lhe foi dada graciosamente no misterioso e lento processo de constituição natural do mundo a que chamamos nosso. Possuídos por um ímpeto imparável e uma arrogância cega dedicámo-nos, com afinco, a transformar o Jardim do Éden num deserto global. Trasportámos o nada, como valor, para o coração físico das coisas. O nosso niilismo de tipo novo, não se limita a ser um niilismo objectivo. É um niilismo ontológico. A história humana parece tender, inexoravelmente, para desaguar no grande estuário do Nada.
Viriato Soromenho-Marques, in Jornal de Letras nº 1316, Março 2021.
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