Terminei por estes dias a leitura da biografia de Luiz Pacheco, escrita por António Cândido Franco, e não posso deixar de reafirmar o fascínio, pelas piores e pelas melhores razões, que este indivíduo provoca em mim. Sou um fiel leitor e consumidor de tudo quanto possa existir de e sobre Luiz Pacheco. Tenho uma profunda admiração pessoal e literária pela sua coragem, pela sua alteridade, pela sua originalidade e genialidade. Um dos maiores e mais ricos personagens da literatura portuguesa do século XX.
O autor termina assim o texto:
"Deu de barato as ambições sociais do tempo, o respeito das convenções, a obediência às regras, o acatamento dos limites. Lutou por ser livre como ninguém da sua geração e a sua vida teve um lado escabroso, o da experiência funda da abjecção, que foi o alto preço que pagou pelo seu combate. Só aquele que como ele vai ao fundo do fundo da noite está pronto para saudar a luz heróica mas falsa do dia. Não batalhou por bens materiais - foi 'um cafre da Europa', um 'cão sem coleira' como de si disse -, mas para afirmar a sua vida. Quis e conseguiu viver livre numa sociedade de escravos e por isso a sua existência teve um sentido épico. Foi dos raros escritores portugueses do seu século que se bateu por ter biografia, que construiu uma vida, que não se satisfez com a vidinha programada que lhe deram - a mesquinha existência dos liceus, das proibições familiares, do funcionalismo, do ordenado mensal, das férias pagas. Transgrediu e arriscou. Fez da vida uma obra, embora a sua arte mais viva, a sua obra-prima, não fosse a vida que viveu mas a vida que escreveu - uma literatura vital, em que a escrita lateja, está viva, e as palavras têm carmim e o sabor a sangue. Escreveu verdades que ninguém sabia escrever."
(Franco, 2023: 456)
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