26 abril 2020

os nossos pescadores


Raul Brandão escreveu estes textos sobre as comunidades piscatórias e sobre as paisagens litorais do nosso Portugal entre 1893 e 1922. Numa viagem por toda a costa portuguesa com paragem especial no seu lugar de coração e memória, a Foz do Douro, Raul Brandão, filho e neto de pescadores, faz uma magnífica e pormenorizada descrição das comunidades humanas, das artes e ofícios relacionados com a pesca, da infindável variedade de peixes, dos fenótipos de homens e mulheres, das embarcações, redes e utensílios necessários à arte, assim como da dura e amargurada vida desta gente que tem o seu sustento dentro de água. Um riquíssimo documento etnográfico que nos permite conhecer essa realidade, em grande parte já desaparecida.
Acho que regressarei a estes escritos, pois vão fazer-me muito jeito para algo que ando a congeminar.

As mulheres só levantam cabeça depois de eles morrerem. Aqui há anos, num naufrágio, perderam-se no mar alguns pescadores da Nazaré. Fez-se uma subscrição que deu para as viúvas viverem algum tempo. E as outras com inveja lá diziam: - Foi pena o meu não ter morrido também...
(página 122)

É a realidade que nos mata. Este panorama é na verdade trágico. Não cessa dia e noite o lamento eterno da ventania e das águas. E os cabos, que são de ferro e escorrem sangue, obstinam-se em apontar o seu destino de dor e esta terra de pescadores.
(página 163)


Agora, mudando radicalmente de época e de tema, irei ler, finalmente, a vida de Leonard Cohen. O livro já me aguarda há vários meses, mas a falta de coragem para entrar no seu universo foi adiando este momento. Vai doer.

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