16 fevereiro 2014

JRC


Poderia dizer que continuo a descobrir o autor, mas já o conheço e reconheço a sua escrita. A cada livro que dele leio fica sempre a sensação que a narrativa é curta e que depressa demais se chega ao seu fim. Uma vez mais José Rentes de Carvalho (JRC) leva-nos a percorrer os caminhos da sua memória, desta feita não pelas arribas do douro e pelas invernias transmontanas, mas pelas duas margens do rio Minho. Sempre num ambiente rural e de extrema pobreza, JRC apresenta-nos um portugal de meados e segunda metade do século XX, miserável e esfomeado, sempre afoito pela transgressão e pela aventura que a actividade do contrabando proporcionava. Elemento, aliás, recorrente na obra deste escritor. Foi leitura nesta tarde soalheira. Venha o próximo.

15 fevereiro 2014

gratificante

Os nossos amigos e conhecidos recorrerem a nós para aconselhamento quando querem comprar um livro para ler ou para oferecer é sempre gratificante. Acabou de acontecer.

14 fevereiro 2014

a caminho de casa...

Conhecedor que não sou da cidade de Lisboa e dos seus recantos, acabo por percorrer sempre os mesmos percursos e revisitar sempre os mesmos lugares. Nestes dias por lá passados, as tardes acabaram obrigatoriamente no balcão do Beira Gare, snack-bar petisqueira junto à Estação do Rossio, para beber uma ou duas Imperiais e a trincar uma Chamuça e um Croquete. Última paragem quando a tarde era já noite, depois, casa. Apesar do seu aspecto gorduroso e de higiene duvidosa, sabe-me sempre bem. Em muitos aspectos faz-me lembrar o Conga - casa das bifanas, no fundo da Rua do Bonjardim no Porto. 

(fotografia roubada daqui)

13 fevereiro 2014

meo, a segunda vida da tmn

Provavelmente já não existem, ou quase não existem clientes como eu, mas a verdade é que o desaparecimento da TMN não me agradou, fiquei até triste. Mantinha com essa marca uma relação que remontava aos primórdios da telecomunicações móveis em Portugal. Fui-lhe sempre fiel, nunca a troquei por nenhuma outra e agora, que parte, sinto-me abandonado, traído e sem saber o que fazer. Bem podem apresentar a MEO como sendo a segunda vida, ou afirmar que tudo ficará igual para os seus clientes. Não me parece e assim sendo, não me sentindo obrigado a qualquer compromisso com esta segunda via, irei arranjar outra, uma com a qual me sinta confortável e possa fidelizar. Pois é, eu sei, sou uma espécie de cliente em extinção, afectivo e pouco racional, não importa pois quando gosto, gosto. 

12 fevereiro 2014

instante urbano XXVI

Ali para os lados de Entrecampos, que é como diz entre o Campo Grande e o Campo Pequeno, numa destas manhãs, estava eu sentado num café a ler o jornal e a tentar escapar ao dilúvio que afogava Lisboa, quando numa mesa ao lado três ou quatro pessoas, por entre um café, comparavam a qualidade do metro de Lisboa e o metro do Porto. Uma voz feminina, que me obrigou a levantar a cabeça, através da sua indumentária verbal afirmou que, tendo vivido algum tempo em Vila Nova de Gaia, sabia bem da qualidade do metro do Porto, mas ninguém poderia chamar "àquilo" metro, pois na verdade é apenas um simples eléctrico. Então não é? Claro que sim, pois ele nem sequer anda debaixo da terra. O de Lisboa sim, é um metro a sério, anda debaixo de terra e é muito mais eficaz, não há comparações possíveis.
Santa ignorância, digo eu sem comparações.

por falar em cultura e em identidade...


Tenho que fazer referência ao excelente ensaio de Vasco Graça Moura - A identidade cultural Europeia - publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, na sua colecção Ensaios da Fundação. Aproveitando o intervalo dos pingos da chuva destes últimos dias, li este pequeno texto que de uma forma sucinta apresenta a história pouco ou nada linear da Europa e as contradições, os conflitos, as dúvidas, os colapsos, as inquietações, as realizações e as descobertas desse percurso para tentar encontrar no final da história uma ou mais identidades possíveis. Muito interessante e muito didáctico. Livro que entrará desde já nas minhas referências bibliográficas e que "obrigarei" os meus alunos a ler.

Stuart Hall (R.I.P)


Foi através do Jornal Público que fiquei a saber da recente morte de Stuart Hall. Conheci a sua obra quando frequentei as aulas de mestrado de estudos culturais, não fosse ele um dos fundadores do centro que foi o berço dos Estudos Culturais na Universidade de Birmingham. Nascido na Jamaica Stuart Hall, viveu desde 1951 na Grã-Bretanha e, por ser emigrante, viveu naquilo que ele considerou "a condição arquetípica da modernidade tardia". Escreveu sempre a partir da diáspora pós-colonial, de um engajamento com o marxismo e o debate teórico sobre cultura num contexto de globalização complexa e contraditória. É através destas suas reflexões que se torna uma das principais referências actuais sobre as dimensões político-culturais da globalização, vistas a partir da diáspora negra.

07 fevereiro 2014

escrever para viver, viver para escrever

Outra notícia interessante que encontrei nesta nova revista LER e trazida por Bruno Vieira Amaral, diz que um inquérito realizado pela Digital Book World no Reino Unido a mais de nove mil escritores revelou que mais de 50% dos escritores que estão ligados a editoras ganham menos de 600 libras esterlinas (730 euros) por ano. Bruno Vieira Amaral questiona e bem: o que é que os motiva no negócio da escrita? Aponta várias hipóteses para resposta a esta pergunta, mas evidencia que estes não vêem a escrita como um negócio. Para eles o dinheiro não é a principal motivação. Viver da escrita é um luxo, mas viver para a escrita é uma missão.

06 fevereiro 2014

omnisciência tecnológica

A notícia poderá até nem ser nova, mas eu apenas a conheci hoje através da revista LER. Segundo esta, a Amazon está a preparar-se para enviar encomendas aos seus clientes ainda antes de eles as fazerem. Lí as "instruções" e não fiquei confuso, nem sou um tecno-céptico, mas a ambição parece-me desmedida e pretensiosa e tal poder de antecipação significaria uma capacidade comercial que iria desestruturar as lógicas comerciais tal como hoje as conhecemos e provocar uma autêntica revolução comercial.
Estará a Amazon.com a ambicionar construir uma nova torre de babel desmaterializada? É preciso estar consciente que a omnisciência é um dom apenas reservado às entidades superiores ou divinas.
José Mário Branco escreve sobre este assunto:
Da Amazon, o gigante mundial da distribuição, já se espera tudo. Há uns meses, foi anunciado o proje­to de usar, num futuro próximo, drones para fazer entregas em qualquer ponto dos EUA num intervalo inferior a 30 minutos. Escolhe-se o que se quiser no site e meia hora depois um veículo voador do tamanho de um helicóptero telecomandado pousa no quintal das traseiras com a encomenda. Impressionante, sim, mas o engenhoso e insaciável Jeff Bezos não se fica por aqui em termos de arrojo tecnológico. Na ânsia de ser sempre mais rápida do que a concorrência, a Amazon está a preparar-se para enviar encomendas aos seus clientes ainda antes de eles as fazerem. Exato: é como se lhes adivinhassem os pensamentos e as intenções. Valendo-se das quantidades incalculáveis de informação armazenada sobre hábitos de consumo (das compras feitas no passado às wish lists, passando pelo tempo que o cursor permanece a pairar em cima de um determinado item), um sistema informático calculará que produtos terão uma probabilidade elevada de serem ­encomendados e acionará o respetivo «envio antecipado». Assim, quando o cliente clicar por fim no botão de compra, o produto já estará em trânsito, ou em espera num armazém mais próximo da morada de destino. Levada às últimas consequências, a ideia acabará por descartar a própria vontade do consumidor, esse obstáculo final à absoluta fluidez do sistema. Chegará o dia em que a Amazon anunciará o algoritmo capaz de definir – sem que tenhamos voto na matéria – o que na verdade cada um de nós precisa de ler, ver ou ouvir.

nova LER...


Pouco tempo depois de a ir buscar ao quiosque e logo depois de um passar de olhos rápido, posso desde já dizer que não gostei da nova revista. E digo nova, não porque haja qualquer novidade gráfica, ou conceptual, mas porque este é o primeiro número em que os seus colaboradores cronistas não foram convocados para tal. Poderei estar apenas a estranhar e a precisar de habituação. Talvez, mas Inês Pedrosa, Onésimo Teotónio Almeida, Eduardo Pitta, Pedro Mexia et all, faziam-me ansiar sempre pela revista. Resta, neste número, a entrevista a Mário de Carvalho e, depois, aguardar os próximos números para LER.

03 fevereiro 2014

António Vieira, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva

Numa aldeia remota de Trás-os-Montes, reuni com um grupo de convivas que sob o pretexto da amizade e da fraternidade, reúnem periodicamente à mesa e alarvemente saboreiam o melhor que há na gastronomia local. Convidado e sem saber do que se tratava e para o que ia, fui surpreendido pela qualidade dos produtos cozinhados e completamente esmagado pela qualidade cultural e tertuliana desse encontro. Não ia preparado para a dimensão e profundidade das palavras que acompanharam o repasto. Um dos assuntos que mais me fascinou foi a reflexão acerca da dimensão humana e intelectual de alguns dos mais ilustres pensadores e autores portugueses.
Por se falar de António Vieira, o padre, enquanto grande vulto do século XVII, da sua obra, da sua vida e da sua coragem, referiu-se o nome de Bartolomé de Las Casas e da sua obra mais conhecida - Brevíssima Relação da Destruição das Índias - onde o autor faz a descrição dos horrores cometidos pelos espanhóis nas descobertas e conquistas realizadas no século XVI pelo continente americano. Obra de referência para os espanhóis que a consideram única, desconhecendo por absoluto a similaridade da obra do português que pouco tempo depois experimentou algo de semelhante nas terras de Vera Cruz. António Vieira será, poucas dúvidas restam, um dos maiores autores da língua portuguesa de todos tempos e foi com ele que surgiu a ideia de quinto império, enquanto crença messiânica e que legitimou o movimento autonomista português em relação à coroa espanhola. Para Vieira os impérios seriam: Assírios, Persas, Gregos e Romanos, aos quais se acrescentaria um quinto, o império português.
Depois, e numa vertiginosa viagem pelo tempo, chegamos ao século XX e a Fernando Pessoa que na Mensagem retoma o tema iniciado por António Vieira e se refere aos cinco impérios, diferindo da escolha de Vieira e identificando o império Grego, o Romano, o Cristianismo e a Europa do Renascimento e das Luzes. A estes, Fernando Pessoa acrescenta um quinto império, o cultural.
Mais tarde e ainda durante o século XX Agostinho da Silva ao reflectir sobre essa crença, transforma o quinto império no império do Espírito Santo, afirmando-se como um cavaleiro do Espírito Santo. 
Esta viagem pelo imaginário lusófono e pela obra destes autores, levam-me de imediato a querer ir revisitar algumas leituras e a descobrir outras tantas. Para o tempo que aí vem.

02 fevereiro 2014

Philip Seymour Hoffman (R.I.P)


Ao saber da sua morte, sempre precoce e estúpida com anúncio prévio de meses ou mesmo anos, recordo o actor que aprendi a apreciar e a admirar. O seu aspecto flácido, incontido e ar deslavado, servido por uma cara laroca de puto reguila e guloso, não o impediram de ter alcançado a fama e a glória de Hollywood. Recordo muitos dos seus personagens, uns maiores, outros menores, uns mais felizes, outros desastrados, mas destaco acima de tudo a intensidade dos seus desempenhos. Nem sequer falarei do papel que lhe permitiu ganhar um Oscar - Capote em 2005, preferindo referir os filmes que me marcaram e nos quais Philip Hoffman contribuiu grandemente para que tal acontecesse. Pessoalmente, destaco os filmes Boogie Nights (1997), The Big Lebowsky (1998), Magnólia (1999), e depois, mais recentemente, aqueles que, para mim, fizeram de Hoffman um dos mais brilhantes actores da actualidade: The Savages (2007) e Synedoche, New York (2008). De qualquer forma, o facto de saber que ele participava em qualquer filme, era o suficiente para eu os querer (tele)ver. Lamento o desaparecimento de um talentoso intérprete.