27 fevereiro 2018

mediascape: sistema eléctrico

Jorge Costa, deputado do BE na Assembleia da República, escreve no Jornal Le Monde Diplomatique - edição portuguesa deste mês de Fevereiro, um grande e excelente, porque claro, factual e fundamentado, artigo sobre a privatização do sistema eléctrico, sobre o rentismo garantido associado a essa privatização e sobre os consequentes prejuízos para o estado português e, principalmente, sobre o abuso permanente sobre os consumidores nacionais. A minha vontade seria transcrever todo o artigo, mas é mesmo extenso e tornaria a sua leitura mais difícil, por isso, opto por transcrever apenas as passagens que me parecem mais importantes e pertinentes.

Metade dos agregados com carência económica não consegue ter a casa adequadamente aquecida no Inverno. A principal explicação são os elevados preços da electricidade e do gás, os mais altos da Europa em paridade de poder de compra. Em 2013, no pico da crise, Portugal foi o país europeu com maior número de cortes de electricidade por falta de pagamento, acima da Grécia.
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O que distingue a factura portuguesa é o peso dos encargos administrativos - que o Eurostat também contabiliza nas taxas e impostos. Esses encargos somam um terço da factura doméstica - são os chamados Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) - e incluem os subsídios excessivos pagos pelos consumidores às grandes eléctricas.
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Ao longo dos últimos dez anos, os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC) representaram 2500 milhões de euros a cargo dos consumidores de electricidade (300 milhões em 2017). Segundo a Autoridade da Concorrência, os CMEC garantiram um terço dos lucros da EDP antes dos impostos, entre 2009 e 2012. E nada de substancial mudou depois disso.
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O corte dos CMEC esteve previsto pela Troika no Memorando de Entendimento assinado em 2011. O então secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes, chegou a encomendar um estudo sobre as rendas excessivas no sector eléctrico. Elaborado pela Cambridge Economic Policy Associates, esse estudo situou o valor total da renda excessiva em 2133 milhões de euros, cobrados aos consumidores só entre 2007 e 2020.
Ante a oposição do ministro das Finanças, Vítor Gaspar - que preparava a privatização da EDP a favor da China Three Gorges e não queria desvalorizar a empresa eliminando estas receitas garantidas - Henrique Gomes não resistiu muito tempo no governo. O seu ministro da Economia e do Emprego, Álvaro Santos Pereira, fez saber mais tarde que a demissão foi festejada com champanhe nas sedes das produtoras eléctricas.
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O peso das rendas pagas à produção renovável aumentou muito com decisões do governo PSD/CDS. Nos anos da austeridade, a tutela continuava a outorgar licenças altamente subsidiadas em processos obscuros, alguns dos quais estão hoje nas mãos do Ministério Público. Mas o escândalo maior ocorreu em 2013, quando o ministro do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, Jorge Moreira da Silva, adiou o fim da subsidiação das eólicas de 2020 para 2027, fixando novas tarifas garantidas para este período adicional. O negócio consistiu numa ruinosa antecipação de receitas.
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O próprio ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, admitiu que este regime transformou a renda das renováveis em "renda e meia".
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Só o controlo público e corte das rendas excessivas pagas às grandes eléctricas será possível obter os meios para impulsionar novos avanços tecnológicos ou o desenvolvimento da produção solar descentralizada e da eficiência energética.
A estratégia privatizadora resultou sempre em custos crescentes para os consumidores. Desde 2006, os aumentos acumulados da factura eléctrica perfazem quase 50%.
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Quanto aos novos donos, em apenas cinco anos de dividendos já recuperaram um terço do que aplicaram na EDP. Nas palavras de Cao Guanjing, presidente da estatal China Three Gorges, "a EDP foi barata".
Do início da privatização até ao domínio chinês, a porta giratória com a política não parou de rodar. Um ex-ministro das Finanças, Joaquim Pina Moura, presidiu à Iberdrola Portugal, a Endesa tem sido representada por um secretário de Estado da Energia dos tempos de Anibal Cavaco Silva e mesmo António Mexia, presidente executivo da EDP, não dispensou uma passagem pelo governo de Santana Lopes, apesar das suas já vastas ligações políticas. Tem hoje ao seu lado, como presidente não executivo, o ex-ministro das Finanças, Eduardo Catroga, ligado ao grupo Mello e representante do PSD nas negociações do Memorando com a Troika, onde ficou decidida a privatização final da EDP. (...) Além destes casos, outros 24 membros de governos passaram por órgãos sociais da EDP. Conhecer esta promiscuidade ajuda a compreender a força que permite manter no sector eléctrico uma pilhagem tão sistemática e permanente contra a maioria da população.
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A dependência do acesso à energia torna-nos vulneráveis à concentração de riqueza através do sector eléctrico. Nenhuma regulação tem sido capaz de travar esse processo. O poder oligopólio da energia torna-o central no regime liberal, nas orientações da União Europeia, na composição da elite política, nas crónicas mediáticas da "livre concorrência". Ora, a energia não é uma mercadoria como as outras. Para não geral novas formas de injustiça e pobreza, como hoje sucede em Portugal, o sistema eléctrico deve ser tratado como bem comum, recurso estratégico e serviço público.


Fonte: SELECTRA

22 fevereiro 2018

opúsculo

Tendo estado até madrugada às voltas com as Nomeadas Transmontanas, apercebi-me da necessidade de consultar os dois volumes da obra de A.M. Pires Cabral "A Língua Charra - regionalismos de Trás-os-Montes e Alto Douro", publicado pela Âncora Editora em 2013. Depois de uma consulta rápida na internet e de ter verificado o seu preço algo exagerado (porque dois volumes), logo pensei e fiz planos para esta manhã ir à Biblioteca Pública Municipal do Porto para a consultar. Assim fiz, só que nenhum dos volumes, apesar de referênciados, existe no depósito local. Desapontado, saí directo para a FNAC da Santa Catarina, mas também não tive sorte, pois não está disponível em nenhuma loja do país. Frustrado, resolvi tentar a Bertrand no Via Catarina, mas esbarrei na mesma ausência. Porra, nem a querer gastar dinheiro se consegue arranjar os livros. Não desisti. Uma vez na Invicta, resolvi ligar directamente para a editora, em Lisboa, que também não me conseguiu, de imediato, dizer em que livrarias do Porto poderia encontrar esses livros. Disseram-me que iriam averiguar e depois me ligariam. Aguardei, mas entretanto pus-me a caminho da Livraria Académica, do meu quase conterrâneo Nuno Canavez. Foi já quando estava à conversa com ele que me ligaram da Âncora, informando-me que aqui perto só a Livraria Traga-Mundos, em Vila Real, é que tinha esses livros à venda. Muito bem, agradeci a disponibilidade e desliguei. Foi a sorrir que comentei o sucedido com o meu interlocutor e ele, também a sorrir, disse-me para não estranhar, pois esta coisa dos livros é muito esquisita... Ele também não tem os livros que procuro, mas ao ouvir o nome do poeta e autor A. M. Pires Cabral, lembrou-se logo de algo que teria para ali guardado e que lhe tinha sido enviado. Um pequeno opúsculo de quatro faces, formato A5, em papel de qualidade amarelado e cuidado, com um pequeno texto e do qual ele me deu esta cópia, dizendo:
- Este é o texto sobre Trás-os-Montes com o qual me identifico mais. Nem o Reino Maravilhoso me satisfaz tanto. Muito bonito, muito bem escrito. Esta é a minha terra.

Vou ler.

por falar em estupidez humana...

Só podia estar a referir-me a Donald Trump!
Quando tudo aconselhava a uma reflexão, a uma ponderação e a uma decisão cautelosa, mas acertiva, o Presidente dos EUA, a propósito dos tiroteios nas escolas americanas que, normalmente, redundam em autênticos massacres e na chacina de inúmeros inocentes, pronunciou-se favorável a que os professores andem armados nas escolas e suas salas de aula, para proteger os alunos em caso de ataques similares ao sucedido nos últimos dias.
Lindo! Professores a dar aulas, ostentando à cintura o seu revolver, ou com a sua carabina de canos cerrados pousada em cima da secretária.
Espectacular! Como é que nunca ninguém se lembrou desta solução?! Agora é que vai ser!

21 fevereiro 2018

mediascape: o bandido


Este é o Ruben Semedo, jogador de futebol português, actualmente a jogar no campeonato espanhol, ao serviço do Vilarreal. Foi detido, se não estou em erro, sob a acusação de agressão, sequestro e roubo. E pelos vistos, já não é a primeira vez que tem problemas com a justiça, sendo já bem conhecido pelas autoridades espanholas, que só nos últimos quatro meses já o detiveram por três vezes. Sendo alguém que teve e tem acesso ao fantástico mundo do futebol, em que nada lhes falta, estranha-se este comportamento desviante, reincidente e assíduo, com ligações a personagens do mundo do crime e do banditismo. Estranho, estúpido, incompreensível. Enfim, um bandido.

20 fevereiro 2018

mediascape: antes de ser, já não era

Não foi preciso chegar ao 37º Congresso do PPD/PSD para termos percebido a forte resistência e o enorme mal-estar no seio das suas elites da metrópole, por Rui Rio ter vencido as eleições directas e vir a ser o novo presidente do partido. Agora que o Congresso da sua tomada de posse aconteceu, o país inteiro percebeu aquilo que está a acontecer no PSD, percebeu a má vontade, o boicote e as ameaças que o novo líder já enfrenta. Ainda não teve tempo para apresentar uma só ideia e já é questionado, coagido e intimidado pelos seus pares com o cadafalso de 2019, e tudo isto com o beneplácito das televisões, rádios e jornais, quais megafones dessa contestação.
Não que me diga respeito, nem que admire particularmente Rui Rio. Conheci-o bem enquanto presidente da Invicta e detestei o seu desempenho. O Porto, ao contrário do que consta pelo país, não beneficiou com os seus mandatos na presidência da autarquia. Aquilo que me admira é a má vontade declarada de grande parte dos ilustres deste partido - deputados, senadores, opinadores e afins - para com o seu novo presidente. Espero estar enganado, mas ser do Porto vai aniquilar-lhe qualquer possibilidade de sucesso.  Cá estaremos para o verificar, ou não.

mediascape: o despudor

É mesmo à descarada e sem perder a face que Pedro Ferraz da Costa, Presidente do Fórum para a Competitividade, numa entrevista ao jornal i, afirma que face ao crescimento do PIB de 2,7% em 2017, a economia teve uma "performance fraquinha" e que se quiséssemos poderíamos crescer acima de 4%. Mais, a propósito da competitividade das empresas nacionais, teve o descaramento de dizer que as empresas não conseguem contratar porque as pessoas não querem trabalhar. Isto, assim e sem mais. Faltou-lhe dizer que as pessoas não querem trabalhar sem receber a respectiva e merecida remuneração e que os seus pares, seres privilegiados e imunes a qualquer crise, procuram trabalho escravo e sem qualquer direito ou garantia. Assim, ainda bem que não conseguem trabalhadores. Ele deveria era sugerir ao seu clã oferecerem um salário digno às pessoas, com garantias e sem precariedades. Talvez aí houvesse quem quisesse trabalhar. Talvez aí as "pessoas" seriam mais produtivas e todos beneficiariam.

Nota pessoal: não fui mal educado com o senhor, apesar da grande vontade. Ainda assim, quando soube deste dislate, muitos nomes feios lhe chamei. Porque o despudor desta gente, que se julga merecedora de todas as benesses e privilégios, tem que ser combatido com tenacidade e vigor.

que mal pergunte

O que se passa com a revista LER? Está a terminar o Inverno e o seu respectivo número ainda não saiu... Vai sair? Ou o projecto findou? Só para saber, desenganar-me e deixar de andar atrás dela...

08 fevereiro 2018

mediascape: sexo, o dogma

D. Manuel Clemente publicou um documento com algumas normas para regular o acesso aos sacramentos católicos de pessoas em situação irregular, isto é, divorciados e recasados, das quais se destaca, a proposta para uma vida de continência, ou seja, uma vida sem sexo, sem relações sexuais. Espanto?! Nem por isso. Uma Igreja conservadora como a Católica não é capaz, às tantas nem era suposto ser, de acompanhar a evolução das sociedades - o seu modo de vida, as dinâmicas sociais, os desafios dos indivíduos e famílias, etc., etc. - da contemporaneidade, mesmo quando está pejada de indivíduos doentes, tarados sexuais, abusadores, criminosos, que viveram e vivem impunes e sem serem incomodados, beneficiando do silêncio cúmplice da hierarquia religiosa. Hipocrisia é o termo apropriado - "façam o que eu digo e não o que eu faço". Por outro lado, só mentes perversas, bolorentas e completamente ausentes da realidade da vida das pessoas, podem acreditar num dogma chamado sexo e que uma existência celibatária é, em si, uma felicidade, uma condição humana superior, ou o atingir de um nirvana qualquer.
Alguns estarão já a dizer: lá está este a implicar com a Igreja. Não, não estou. Mas o facto noticiado é de tal forma ridículo que me era impossível ficar quedo e mudo sobre o assunto. Tal como o teólogo Anselmo Borges, citado pela mesma notícia, afirma: Não faz sentido admitir que estão casados, por um lado, e pedir-lhes que não tenham vida sexual, por outro. É contra a natureza humana. Ao impossível ninguém é obrigado.
Resta-me uma dúvida: qual será a percentagem de fiéis católicos praticantes que aceitam para as suas vidas os preceitos sexuais da sua religião? Gostava de saber, apesar de ter uma ideia muito clara sobre os valores residuais dessa percentagem.
Depois admiram-se do esvaziamento das igrejas, do afastamento dos jovens e menos jovens, da diminuição do número de baptizados, casamentos e até celebrações fúnebres religiosas. Como não?!