28 março 2019

ler e escrever

Não nascemos para ler, nem para escrever. Ler é o milagre da comunicação na solidão. Ler não é só ler. (...) Ler é não regressar.. (...) É o silêncio a barafustar connosco e a dizer baixinho na solidão: eu também, eu também. (...) Viver é aprender a escrever e recusar querer só passar por esta vida. (...) Escrever é a bengala da memória humana, o computador é precisamente o contrário, é a autorização do esquecimento. A escrita é o pacemaker dos passados, o que nos permite não repetir o que nunca quisemos fazer e deu errado. (...) Não fomos feitos para ler nem escrever, é certo, e por isso não há nada de destino nesta coisa de querer ler ou escrever. Mas foi por nos habituarmos a ler e a escrever, que nos tornamos no que somos.
(Patrícia Portela, in Jornal de Letras nº 1264, Março 2019)

27 março 2019

after life

Aos poucos vou-me habituando a consumir aquilo que a Netflix tem no seu catálogo. Por insistente pressão da Emília, subscrevi uma assinatura da referida produtora de filmes, séries, documentários e afins. Sei que ela tem consumido frequentemente e, de alguma forma, justificado o valor mensal que pago. Eu, que tanto resisti inicialmente, começo agora a descobrir o encanto do formato, na medida em que poderemos visualizar, de seguida, os episódios que quisermos. Aconteceu-me com a série Homeland, cuja sétima temporada, vi em duas noites, ou seja, seis episódios de cada vez; aconteceu agora novamente com esta mini-série After Life de Ricky Gervais, que vi de uma só vez (seis episódios). Tinha-a referenciado através dos comentários, diga-se, difusos, que fui recolhendo no Twitter. Depois de a ter visto, percebo a amplitude das opiniões sobre a série, pois também para mim ela é merecedora de vários sentimentos. De uma forma geral, sendo considerada uma comédia, tive alguma dificuldade, salvo num ou noutro momento, em encontrar esse fulgor humorístico, talvez porque o tema central da série seja demasiado sério e pesado para tal ligeireza de comportamentos e discursos. Por outro lado, reconheço, em alguns momentos, o génio narrativo, nomeadamente, nos diálogos entre o personagem central e a senhora do cemitério, ou entre o mesmo e a cuidadora que trata do seu pai no lar de idosos. Na antítese desse génio, está o último episódio, que não passa de um sucessivo e precipitado acumular de resoluções óbvias e clichés dos tramas melodramáticos e de finais felizes. Ainda assim, aconselho a sua visualização.

08 março 2019

solilóquio

Não me preocupa aquilo que sei, ou o conhecimento que "já cá canta". Aflige-me tudo aquilo, o tanto, que ainda não sei, nem conheço.

mediascape: culpa


Em dias de luto nacional e de greves internacionais pela dignidade, segurança e vida das mulheres, solidário e feminista me reconheço. Coincidência ou não, ontem, dia de luto nacional pelas vítimas da violência doméstica, com direito a oficiais celebrações, foi conhecido o afastamento, pelo Supremo Tribunal de Justiça, do juiz desembargador Neto de Moura em casos de violência doméstica. Finalmente, dizemos todos nós portugueses. Mas, infelizmente, o problema da misogenia na justiça portuguesa não fica resolvido com o impedimento deste juiz, longe disso. O que é relevante e significativo nesta decisão de afastamento é a admissão de culpa, o reconhecimento de um anacronismo na justiça, por parte da própria justiça, e isso é bom e, esperemos, seminal. Tal como já escrevi, o que seria importante num momento como o actual, era a alteração do quadro jurídico que regulamenta o crime de violência doméstica e os crimes sexuais/de género, pois também pelos casos conhecidos e que vão sendo notícia, está mais do que provado que a lei não protege convenientemente as vítimas e é permissiva e, diria mesmo, incentivadora, da perpetuação desses comportamentos desviantes e violentíssimos.
Justiça é o que se quer. Só e apenas.

06 março 2019

prevenção e inveja

Acabei de receber um email da Autoridade Tributária avisando-me que tenho que limpar os meus terrenos até ao próximo dia 15 de Março. Muito bem. Como eu gostava de limpar a minha floresta... Eu, se fosse proprietário desses magníficos espaços livres, não deixaria de tratar deles, mas infelizmente apenas sou proprietário de um espaço inerte, construído em tijolo e cimento, dividido em meia-dúzia de divisões, cuja limpeza implica outros processos e outros ingredientes.
Limpem o que é vosso!
Inveja.

01 março 2019

mediascape: placebo

A nova ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Mariana Vieira da Silva, vai propor ao Conselho de Ministro que decrete o dia 7 de Março como o dia de luto nacional pelas vítimas de violência doméstica. A sério?! As vítimas não querem homenagens, querem é uma política, uma estratégia de acção que as possa efectivamente proteger das terríveis agressões que têm sido alvo. Num ano em que já foram assassinadas tantas mulheres, o Governo apresentar como grande medida um dia de luto nacional, parece anedótico e é ofensivo, não só para as vítimas dessa violência, como para todas as mulheres portuguesas. Haja senso, haja respeito e dignidade.

vinte anos de bloco, à esquerda

O Bloco de Esquerda (BE) celebrou ontem, 28 de Fevereiro, vinte anos de existência. Parabéns ao BE.
A minha aproximação ao movimento aconteceu em 2003 e desde então já experimentei um pouco de tudo. Pouco tempo após a inscrição, fui eleito membro da Assembleia Municipal de Bragança, onde exerci dois mandatos consecutivos (2005/2009 e 2009/2013). Neste último ano, apesar de ter sido novamente candidato, não fui eleito e a partir dessa altura, a minha participação diminuiu substancialmente. Durante esses oito anos de eleito em Bragança, entre outras acções e participações, a minha militância activista levou-me a ser eleito membro da Mesa Nacional (principal órgão do BE entre convenções), a fazer parte da sua Comissão Nacional Autárquica, a ser mandatário do concelho de Bragança da candidatura presidencial de Manuel Alegre (2011).
O BE celebra vinte anos de existência e eu dezassete de militância. Continua a ser o meu espaço de conforto ideológico para a intervenção cidadã.