28 dezembro 2018

a igualdade

Boaventura Sousa Santos (esse mal amado pela lusa pátria das ciências e afins...), no Jornal de Letras (nº 1258), escreve sobre o desafio que lhe propuseram para a sua participação no 1º Fórum Mundial do Pensamento Crítico, que se realizou em Buenos Aires, no passado mês de Novembro. O repto era: explicar a igualdade aos 1% mais ricos do mundo.
Daquilo que escreveu, saliento e transcrevo as seguintes ideias:

No século XXI, e depois de todas as vitórias dos movimentos feministas e antirracistas, seria mais correcto explicar não a igualdade mas a diferença. A igualdade não existe sem ausência de discriminação, ou seja, sem o reconhecimento de diferenças, sem hierarquias entre elas.
(...)
Temos o direito a ser iguais quando a diferença nos inferioriza e o direito a ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza.
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A filosofia eurocêntrica - e as epistemologias do Norte que dela nasceram e deram origem à ciência moderna - assenta na contradição de defender em abstrato a igualdade universal e ao mesmo tempo justificar que parte da humanidade não é plenamente humana e não é, por isso, abrangida pelo conceito de igualdade universal, seja ela constituída por escravos, mulheres, povos indígenas, povos afrodescendentes, trabalhadores sem direitos, castas inferiores.
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Uma metáfora menos chocante será a de pensar que a ajuda ao desenvolvimento ajuda de facto os países a desenvolver-se. Ao contrário do que promete, ela contribui não para desenvolver os países mas para os manter subdesenvolvidos e dependentes dos mais desenvolvidos.
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As epistemologias do Sul que tenho vindo a defender partem dos conhecimentos nascidos nas lutas daqueles e daquelas que viveram e vivem a desigualdade e a discriminação, e resistem contra elas. Estes conhecimentos permitem tratar a igualdade como denúncia das desigualdades que oculta ou considera irrelevantes para a contradizerem. Permitem também tratá-la como instrumento de luta contra a desigualdade e a discriminação. Apenas para dar um exemplo: as epistemologias do Sul permitem reconceptualizar o capital financeiro global, o verdadeiro motor da extrema desigualdade entre pobres e ricos e entre países ricos e países pobres, como uma nova forma de crime organizado.
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À luz das epistemologias do Sul, os crimes cometidos pelo capital financeiro global serão uns dos principais crimes de lesa-humanidade do futuro. Junto com eles e articulados com eles estarão os crimes ambientais.

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