03 setembro 2012

de pequenino se impõe um destino *

Nos últimos dias tem andado nas bocas do mundo do nosso país, principalmente nas palavras escritas e ditas dos nossos fazedores de opinião, a mais recente proposta do ministro da educação Nuno Crato. A de impor o ensino profissional aos alunos com piores (ou maus) resultados no 2º ciclo - alunos com duas reprovações ou três chumbos intercalados até ao 6º ano serão obrigados a frequentar esta via. Ao ouvir e ler muito do que se tem dito acerca deste assunto, relembro-me de um texto de Pierre Bourdieu intitulado "O Racismo da Inteligência" escrito em 1978 e que foi uma intervenção sua num colóquio do Movimento contra o Racismo e pela Amizade entre os Povos realizado em Maio desse mesmo ano. Apesar da distância temporal, a sua enunciação parece-me mais do que actual e pertinente, pois Bourdieu define esse racismo da inteligência como um racismo da classe dominante e é alguma coisa por meio da qual os dominantes visam produzir uma "teodiceia do seu próprio privilégio", como diz Weber, quer dizer uma justificação da ordem social que dominam. É qualquer coisa que faz com que os dominantes se sintam justificados na sua existência enquanto dominantes; com que se sintam uma essência superior. Bourdieu acrescenta que todo o racismo é um essencialismo e o racismo da inteligência é a forma de sociodiceia característica de uma classe dominante cujo poder assenta em parte na posse de títulos que, como os títulos escolares, são considerados garantias de inteligência e que tomaram o lugar, em muitas sociedades, e no que se refere ao próprio acesso às posições de poder económico, dos títulos antigos como os títulos de propriedade e os títulos de nobreza. Ao longo dos últimos tempos e ao escrutinar a realidade que me rodeia, é com alguma assiduidade que me ocorre este conceito, pois frequentemente o "poder" faz uso desse seu poder para manter os paradigmas actuais e para restringir ou mesmo impossibilitar qualquer permeabilidade social. Regressando ao ensino profissional e ao ministro Crato (que Daniel Oliveira descreveu como o Talibã do ensino), penso que é necessário e até uma mais-valia para a economia nacional, mas sempre como uma opção para os jovens estudantes que nele poderão encontrar um caminho e uma opção profissional válida.

* Frase roubada de um texto de José Soeiro.

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