27 fevereiro 2009

Sem nunca o ter esquecido, recordo-o amiúde, particularmente e sem saber porquê, nestes últimos tempos. A sua presença fazia-se sentir pela figura altiva, bem posta, respeitosa e pelo seu temperamento paternalista e afectuoso. De tez morena e modos lentos, mas acertivos e vigorosos, destacava-se no seu comportamento, a incessante preocupação em agradar aos demais, pelo menos àqueles que consigo conviviam - recordo a abundância e generosidade com que nos recebia em sua casa...
Conheci-o apenas no final de Outono da sua vida, quando o corpo e, principalmente, a memória davam já os primeiros sinais de falência. São muitas as memórias de momentos partilhados e ainda hoje guardo comigo a segurança do seu cuidado, o aconchego e o cheiro do seu abraço e o macio de seu rosto.
Nascido em 1915 no termo de Vinhais pôde completar a 4ª classe, casou cedo e percebendo que a escravidão da lavoura de então não lhe daria muito mais do que quase nada, partiu para o Brasil em busca de uma outra condição, deixando para trás a mulher e seis filhos. Terá corrido bem a vida em terras de Vera Cruz o que lhe permitiu, não só sustentar a família em Portugal, como regressar passados alguns anos a Portugal e à sua terra natal. Com a morte prematura da mulher, deambula pelo país e, em 1973, ano zero da minha existência, casa em segundas núpcias com uma viúva de Famalicão. Aí, numa pequena mas viva comunidade industrial, estabelece-se e vive o resto dos seus dias. Homem empreendedor, investe na pequena indústria transformadora, na construção civil e na compra e venda de propriedades.
Tratava-me carinhosamente por Miguel e a última vez que estive com ele foi em 1996, por ocasião do seu 81º aniversário e poucos dias antes do seu fim, que chegou numa qualquer manhã e depois de assistir à missa. No passado dia 18 de Fevereiro completaria 94 anos e por isso estas palavras estarão atrasadas. Ainda assim, fica o registo de uma memória que teima em conviver comigo. O seu nome era José Marcelino e era Avô.

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