14 outubro 2013

notas de um bloco

(reflexão a propósito da actualidade de um partido de esquerda)
Em democracia não pode haver só vencedores. Há sempre os vencidos. É nesta condição de vencido que o Bloco de Esquerda (BE) se encontra desde 29 de Setembro. Isso por si só não é grave, pois essa mesma democracia se encarregará de alterar os dados do jogo, assim queira o BE.
O BE foi, a par do PSD, o grande derrotado destas eleições autárquicas. Ninguém, dentro ou fora do movimento, terá dúvidas em relação a isto. Por isso mesmo, as primeiras reacções da nossa coordenação política foram tão disparatadas. Perante tamanho rombo nos votos, na percentagem e nos mandatos autárquicos, João Semedo vem a público rejubilar com a tremenda derrota da direita e do governo. Errado. Senti-me envergonhado. Primeiro teria que reconhecer e voltar a reconhecer os péssimos resultados do BE e só depois, em nota de fim de página, então mostrar satisfação pela penalização que os portugueses infligiram ao PSD. Mas mesmo assim, todos conseguiram vencer autarquias, uns mais outros menos, e o BE nada.
A frustração é enorme, por várias razões, mas desde logo, porque este foi o primeiro momento em que os eleitores poderiam ter denunciado a governação da troika e dos partidos nacionais que a suportam. Mas assim não fizeram e depositaram o seu voto, a sua confiança nos mesmos partidos. Não percebo, mas não enjeito uma leitura: é que essa votação e na actual conjuntura só vem realçar a inutilidade do discurso do BE e dos demais partidos anti-troika. As pessoas assim querem, assim o merecem, assim o terão. Afinal de contas o que andamos a fazer e a dizer?! As pessoas não acreditam na nossa mensagem, ou pura e simplesmente já não nos ouvem. De que serve haver descontentamento, indignação e repulsa pelo que o governo e seus partidos andam a fazer, se depois esses sentimentos não se transformam em votos no BE? Os portugueses acharam melhor votar em branco ou nulo do que no BE. Mau demais. 
Outra das causas para esta frustração é a teimosia do BE em querer apresentar candidatos autárquicos em toda e qualquer esquina deste país. Está errado e passo a explicar porquê:
- É sempre a mesma correria, o mesmo frenesim para os funcionários do BE, a contactar, a cooptar, a recrutar, a organizar, a convencer nomes e listas, nos meses que antecedem cada acto eleitoral autárquico. A culpa não é deles, apenas dão seguimento àquilo que são as directivas vindas de Lisboa;
- Aceitação de indivíduos desconhecidos e sem passado conhecido de intervenção ou activismo de esquerda, cívico, associativo ou político;
- A verificação da inexistência de quadros políticos com formação em grande parte das estruturas locais e regionais;
- A incapacidade de gerar sinergias, ou compromissos, ou entendimentos com outras forças políticas, ou com movimentos de cidadãos independentes, apartidários ou meramente comprometidos civicamente;
- A constatação da desqualificação daqueles que se propõem ou ambicionam ser candidatos do BE;
- A inexistência de uma estrutura - orgânica, humana e logística - capaz de suportar tantas candidaturas. Com diferentes características, recursos e pessoas, cada candidatura local tem as suas idiossincrasias e especificidades que os serviços centrais jamais alcançaram, conheceram ou compreenderam;
- Tal como defendi e disse em 2005, tal como reforcei a ideia em 2009 e agora voltei a relembrar, não podemos, não devemos ter candidatos às autarquias que não tragam consigo mais valias políticas, capacidades crítica e de projecto, reconhecimento público. Não podemos, mesmo, ter candidatos a merecerem a confiança de 10, 20 ou 30 eleitores. É preferível ficar quieto, quedo e mudo. Será sempre preferível, porque menor danos causará ao partido reconhecer incapacidade de apresentar candidaturas por todo o país. Não poderemos continuar expostos a estas cíclicas humilhações;
Bem sabemos que é sempre depois dos erros, que se dão os maiores e melhores passos. Contudo, receio é que no fim, nada de novo aconteça e tudo fique mais ou menos na mesma. A atitude perceptível é o silêncio, de querer que o tempo se encarregue de ultrapassar este mau momento. Lamento se assim for, pois ao contrário da ilustre sapiência central do BE, as eleições locais são muito importantes para a capacidade de crescimento e fidelização da base social do partido. E depois convém não esquecer que dentro de meio ano teremos novas eleições, desta vez para o Parlamento Europeu, e infelizmente já não contaremos com o Miguel Portas.

Sem comentários: