23 janeiro 2016

o neo pós-colonialismo lá da terrinha*

Eu até acho que já falei deste assunto aqui, mas como não me apetece ir à procura desse texto, nem sei quando foi que o escrevi, aqui vai:
Aqui há dias levaram-me a um restaurante cuja especialidade é o rodízio brasileiro, lá para os lados de S. João da Madeira. Era fim-de-semana e até música ao vivo tinha. O ambiente quente contrastava com o frio que se fazia sentir na rua e foi com algum prazer que nos pudemos aliviar dos trapos de Inverno.
Não recordo a última vez que entrei num restaurante destes, pois por iniciativa própria nunca os frequento. Eu sou daqueles que gosto de pagar para comer bem, que gosta de viajar para comer. Mas dos rodízios não, não gosto deles e vou explicar porquê.
Gosto de comer aquilo que me apetece, quando me apetece, mas nestes restaurantes são os empregados que determinam o que eu como e quando como. Não pode ser;
Gosto muito de algumas das carnes que estão incluídas no rodízio, mas detesto que me estejam, durante várias dezenas de minutos, a impingir legumes, frutas e mandioquices, como quem nos tenta encher o estômago, antes de trazerem as carnes que importam;
Não gosto de pagar tanto por tão pouco;
Mas acima de tudo, não gosto da filosofia que estrutura estes negócios, pois para além de não serem honestos, querem fazer-nos de parvos e idiotas, numa atitude sobranceira de chicos-espertos. Aliás, se repararmos, o desenvolvimento da própria refeição é, em si, uma manifestação dessa sobranceria cultural;
Incluo este negócio, vindo originalmente do Brasil, naquilo que são os discursos e as práticas pós-coloniais, que normalmente se traduzem numa inversão da supremacia cultural, económica e até social das comunidades anteriormente colonizadas. Actualmente, estaremos já numa fase posterior a essa inversão cultural e, numa lógica globalizadora, o equilíbrio cultural ter-se-á imposto com naturalidade, salvaguardando as identidades e suas diferenças. Estaremos assim numa fase de neo pós-colonialismo, onde cada comunidade exporta e importa aquilo que entende e gosta.


* aproveito a designação dada por um jornal brasileiro ao referir-se à super-modelo portuguesa Sara Sampaio, como sendo lá da "terrinha", ou seja, lá de Portugal. Ora aqui está mais um exemplo daquilo a que chamo de discurso neo pós-colonialista.

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